Diante dos últimos acontecimentos em ‘A Fazenda 2023’, principalmente entre Márcia Fu e Rachel Sheherazade, os telespectadores dividem opiniões sobre as participantes. No entanto, as atitudes vão muito além do que as câmeras podem captar, e refletem um passado conturbado que esconde inúmeras adversidades, na vida pessoal e profissional.
Márcia Fu, conhecida por sua trajetória brilhante no esporte, sendo indicada 10 vezes como melhor do mundo, começou a enfrentar grandes obstáculos ainda criança, quando percebeu que não desejava seguir com os estudos. Sem muitos caminhos à disposição, foi direcionada para o vôlei por sua irmã mais velha, Maria Aparecida Cunha Figueiredo.
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Esguia, determinada e com espírito de liderança, aos 14 anos já ocupava lugar de destaque na Seleção Mineira, e com 15 ingressou na Seleção Brasileira, uma carreira que iniciou cedo, de repente. Foi então que Márcia viajou o mundo, conquistou títulos e sentiu muitas dores longe dos que amava. Foram nove operações no joelho e muitos pinos, além de três cirurgias no braço, que trouxeram três pinos, longas recuperações que tinham como companhia um desânimo interminável, que a separava da quadra. Mas mesmo afastada da família, a jovem negra, discriminada e desacreditada por muitos venceu, conseguindo a medalha de Bronze em Atlanta, em 1996.
Já no amor, a jogadora não obteve êxito. Teve três casamentos, sendo o seu primeiro o pior deles, com Eduardo Barbosa. O ex-marido levou praticamente todo o patrimônio conquistado por Márcia. Os bens levados por ele incluiam carro, casa e, principalmente, a saúde mental da atleta, que já estava ameaçada.
Fu, apelido que Márcia ganhou quando criança por conta do “furacão” que era, precisou resgatar toda a sua potência para enfrentar seu maior inimigo até então, o câncer. Diagnosticada com câncer na bexiga em 2001, ela lutou contra a doença até poder se reerguer e iniciar uma nova vida.
Em 2012, Márcia deu à luz seu único filho, Gabriel Cunha de Menezes, que hoje está com 11 anos e torce pela mãe dentro do reality. Durante o confinamento, Gabriel está com a tia, Maria Aparecida. A criação do menino também foi outro desafio que a atleta enfrentou. Como mãe solo, ela não conta com a ajuda financeira do ex-companheiro, e ingressou no programa para garantir uma boa vida ao filho.
Considerando os comportamentos explosivos de Márcia Fu que estão sendo observados nos últimos dias, a psicóloga Paulla Junqueira, especialista em Neuropsicologia Clínica, ressalta a importância do acompanhamento com profissionais ao longo da vida e salienta que algumas experiências negativas podem levar ao estresse crônico. Este, se não tratado e acompanhado por um profissional de área de saúde mental, pode resultar em condutas de defesa, que nada mais são do que maneiras de evitar que certas agressões se repitam.
Segundo Paulla, as mulheres negras sofrem um julgamento extra que parte do racismo estrutural: “A agressividade é uma emoção natural do ser humano, mas é impossível deixar de mencionar que mulheres negras são, já inicialmente, lidas como raivosas e assim, mesmo quando sua fala é assertiva, há uma grande chance serem interpretadas como agressivas. A mulher negra em meio social, tem suas emoções invisibilizadas, além de enfrentar opressões de todos os lados, de gênero e raça. Ter que se posicionar e resistir o tempo todo é exaustivo. Por isso, é compreensível que aconteçam episódios explosivos pontuais e repentinos”.
A psicóloga, que também se especializa em saúde mental da mulher, menciona ainda a imposição à qual esportistas negros são submetidos. “O esporte entra na vida de jovens em estado de vulnerabilidade econômica como forma de ascensão. O atleta negro também enfrenta o racismo no esporte, pois estudos afirmam que o bom empenho de esportistas negros é visto como atributo natura e tal visão contribui para que o esforço do atleta seja invisibilizado, trazendo a esta categoria um sofrimento ainda maior”.
Maria Aparecida, responsável por levar Márcia Fu para o mundo esportivo, concorda com a profissional e garante que sua irmã tem medo de ser machucada novamente – por isso opta por se blindar diante dos recursos, internos e externos, que lhe foram disponibilizados ao longo da vida. “Hoje, com uma idade já avançada, percebo o quanto é importante adquirirmos hábitos saudáveis para que nossos comportamentos sejam mais leves. No entanto, fomos educadas a ser mulheres fortes, afinal, precisamos nos impor antes mesmo de sofrermos alguma violência, para evitarmos que sejamos machucadas, pois infelizmente faz parte do nosso dia a dia sermos machucadas”, revela.