Uma nova pesquisa aponta que os dados oficiais do Brasil sobre alunos com deficiência estão subestimados. Em vez de 3,7% dos estudantes da educação básica, como registra o Censo Escolar mais recente, seriam 12,8%, de acordo com o levantamento.
O Censo Escolar, utilizado para políticas públicas, reporta que apenas 1,8 milhão de estudantes possuem alguma deficiência. No entanto, a pesquisa conduzida pela Equidade.info revela um número muito maior, estimando que mais de 6 milhões de alunos possuem algum tipo de deficiência ou transtorno de aprendizagem.
De acordo com o levantamento, esses novos números trazem à tona a necessidade de incluir quase 4,3 milhões de crianças e jovens não contabilizados em políticas públicas ligadas à educação especial e inclusiva.
Essa subestimação impacta diretamente na formação dos educadores, contratação de profissionais especializados e adaptação das infraestruturas das escolas. A pesquisa foi realizada pela Equidade.info, ligada à Escola de Educação da Universidade de Stanford, com apoio do Stanford Lemann Center e da Fundação Itaú.
O estudo analisou 160 colégios públicos e privados de todos os estados do país. Foram entrevistados 2.889 estudantes, 373 professores e 222 gestores escolares.
Por que os dados oficiais estão subestimados?
A disparidade entre o estudo e o Censo Escolar se explica pelas diferentes metodologias aplicadas. Segundo Guilherme Lichand, um dos pesquisadores de Stanford, o Censo Escolar se baseia em dados fornecidos pelas próprias escolas, que frequentemente não reportam todos os casos devido à falta de laudos médicos ou à subnotificação de certas deficiências.
“Em 80% das escolas, os questionários do Censo Escolar são preenchidos por secretários, sem consultar alunos ou familiares“, disse Lichand em entrevista à Folha de São Paulo. “Esse funcionário geralmente reporta apenas os casos de estudantes com laudos médicos, desconsiderando outros problemas que afetam a aprendizagem.”
Como alunos com deficiência são afetados?
Alunos que apresentam deficiências porém não estão contabilizados no Censo podem enfrentar dificuldades ao não receber as adequações e apoio necessários. A pesquisa revelou que:
- 21% dos alunos têm dificuldade para escutar o professor, mesmo quando sentados perto e com a sala em silêncio. Já 5% dos alunos não conseguem escutar o professor de jeito nenhum. Destes, dois terços afirmam que não tem apoio da instituição de ensino para lidar com a dificuldade.
- 25% dos alunos têm dificuldade para enxergar a lousa, mesmo usando óculos. 5,7% dizem não conseguem de jeito nenhum enxergar o quadro. E 73% deles afirmam não ter recebido auxílio da escola.
- 8,6% dos alunos têm problemas de comunicação, compreensão e sociabilização. Destes, 62% afirmam não receber apoio da instituição e profissionais.
No geral, o estudo apresentou que 5,7% dos estudantes apresentam dificuldades visuais, 5,2% problemas auditivos, 1,4% possuem uma combinação de ambos, 2,1% dificuldades motoras e 3,1% dificuldades intelectuais.
No Brasil, segundo Lichand, há ainda uma “visão medicalizada” das deficiências e dos transtornos de aprendizagem, desconsiderando várias dificuldades dos alunos que podem impactar seu direito à aprendizagem. Em muitos países, o foco está mudando para uma abordagem mais social, permitindo que as escolas se preparem melhor para atender às necessidades específicas dos estudantes.
Praticamente metade dos docentes (49%) diz não se sentir preparada para lidar com as múltiplas deficiências dos alunos, o que destaca a urgência de políticas de formação contínua para a educação inclusiva.