Fotos reais de Juan Carlos, o rei emérito da Espanha

Em seu novo livro, “Mon roi déchu” (“Meu Rei Caído”), Laurence Debray descreve o personagem que encontrou quando chegou à Espanha

Fotos reais de Juan Carlos, o rei emérito da Espanha
Juan Carlos, o rei emérito da Espanha (Crédito: Daniel Perez/Getty Images)

Desde que Juan Carlos, o rei emérito da Espanha, partiu para Abu Dhabi em uma espécie de exílio forçado, apenas três imagens foram divulgadas. A primeira é uma foto do momento em que ele desceu do avião nos Emirados Árabes Unidos. A figura do rei, cujo rosto é coberto por uma máscara, desce da nave por uma pequena escada e se inclina em direção a um auxiliar que o espera ao pé da pista. Vemos, como em quase todas as fotos de Juan Carlos nas quais é obrigado a se mover, fragilidade, insegurança, lentidão.

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Há uma segunda foto em que, por essas razões, ele exibe outro exercício incômodo. Em um cais estreito próximo ao qual está atracado um barco, o rei, com o corpo dobrado, apoia-se em dois assistentes, cada um dos quais segura um dos seus braços e o ajuda a manter o equilíbrio.

A terceira foto do monarca divulgada desde o início de seu exílio, o encontra diante de uma longa mesa no terraço do hotel onde está hospedado. Em frente a um café, ele de um lado da mesa e o príncipe herdeiro, Mohamed bin Zayed, do outro. O rosto do monarca guarda a impostura momentânea de um piscar institucional, mas as suas mãos, uma em cima da outra, apoiadas na borda da mesa, revelam a sua paciência diante de uma resignação imposta.

Todas essas fotos contradizem a que, em sua época, Laurence Debray pendurou na parede do seu quarto. Não sabemos como era aquela imagem, mas quase certamente era magnânima. Como aquelas que seu pai Regis desenhou de Ernesto Guevara ou aquela que a fantasia de sua mãe, a historiadora Elizabeth Burgos, construiu do Fidel Castro.

Debray, a escritora, conta em seu novo livro de memórias (que publicou com apenas 40 anos), que a foto de Juan Carlos em seu quarto foi removida por seu pai que, em seu lugar, colocou outra do presidente Mitterrand. Ela não gostou da mudança, escreve, visto que deplora a atitude dos seus pais, revolucionários nos anos 60, mas adaptados ao soft power na velhice.

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Em seu novo livro, “Mon roi déchu” (“Meu Rei Caído”), Debray descreve o personagem que encontrou quando chegou à Espanha: “Não havia glamour associado a Juan Carlos: nem castelos majestosos, nem cerimônias fabulosas. Nesse sentido, ele ia contra o estereótipo do rei, encarnava o antimonarca, aquele que não é esmagado pelo peso da Coroa. Tinha a imensa vantagem de ser bonito, jovem, atlético, carismático e de governar um país que me conquistou por ter vivido nele um tempo abençoado, uma adolescência despreocupada, no final dos anos 80 e início dos 90”.

A revista “Paris Match” entrevistou Debray por ocasião da publicação do livro na França e a mídia espanhola reproduziu as suas declarações, já que a autora esteve em Abu Dhabi conversando longamente com Juan Carlos. Tratam-se, todas elas, de confissões sentimentais em que se desenha um personagem derrotado, que denota ressentimento e balbucia a sua tristeza em acontecimentos tão íntimos quanto o fato de seu filho não ter telefonado para ele no dia do seu último aniversário. A leitura política é a redução pela via emocional emocional do reality show de um falso exílio diante das três investigações abertas pela Procuradoria contra o monarca. Mas a autora também tem os seus objetivos, tentando dar um destino à fotografia pendurada em seu imaginário adolescente: “A vida dele é um romance”, escreve ela.

“Juan Carlos se tornou ‘meu’ romance. Isso deve acabar. Já que ele decidiu desaparecer antes de morrer, eu também devo concluir”

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Tudo indica que, por ora, esse fim, o da sua decepção, fecha em falso, pois ela especula que “Shakespeare não poderia ter feito melhor. O banimento final é até a apoteose. Definitivamente, Juan Carlos não é um rei como os outros”.

A tragédia de Juan Carlos, se for isso mesmo, não é shakespeariana mas uma trama de reality show e, se formos procurar uma referência, talvez seja melhor Laurence Sterne, homônimo da escritora: seria em seus argumentos abertos e em seu uso da paródia como ferramenta narrativa, um híbrido genial, que poderíamos encontrar ecos das circunstância do monarca.

*Por Miguel Roig – Escritor e jornalista.

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*Produção jornalística – Silvina L. Márquez.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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