A extrema direita nega as mudanças climáticas há décadas, sempre recorrendo aos bordões simplistas que ganham vida e tração na onda dos memes, a leitura predileta (e talvez única) deste segmento político.
Recentemente, com as evidências do que antes era abstrato e teórico se tornando consequências que estapeiam nossas faces, a extrema direita mudou a postura em algumas das suas falanges e isso já é visível no discurso de líderes e material de comunicação. Agora, as mudanças climáticas são admitidas, mas não derivam da ação humana.
O que isso quer dizer?
A extrema direita aceita parcialmente o diagnóstico da Ciência, porque acolhe apenas o que o grande público consegue depreender: já estamos sofrendo as consequências destas mudanças.
E qual é a proposta destes líderes negacionistas?
Nada fazer do ponto de vista institucional. Nenhuma solução multilateral, nenhuma ação transnacional e tampouco se envidar esforços e investimentos para se tentar frear a curva de mudanças derivadas das emissões de dióxido de carbono, perda de biodiversidade ou destruição de reservas hídricas. A proposta da extrema direita é a de que nada pode ser feito e teremos que conviver com as mudanças climáticas sem nem mesmo tentar as reduzir.
Por que?
Porque isso redundaria na ideia do Poder Público tentar moldar alguns comportamentos individuais e de empresas, significaria uma ação coletiva, pública e privada, algo que causa alergia à extrema direita.
Isso significaria também se curvar às evidências de que os ancaps e libertários não têm a solução para problemas monumentais e que o Estado, com todos os problemas que ostenta, ainda é necessário.
Em certa medida, o EXTREMO da “extrema direita” significa justamente isso: um compromisso radical com seus credos políticos e dogmas econômicos a ponto de preferir dobrar a realidade do que se curvar a ela.
Essa, é enfim, a raiz para que a extrema direita esteja despejando fake news no bioma cibernético. É preciso desacreditar o Poder Público em um evento, onde só o Poder Público tem a capacidade política e logística de responder a um desafio tão gigantesco. Só o Poder Público, com seus defeitos e vicissitudes tem as condições de separar preço e valor, nesta gigantesca tarefa de salvar vidas humanas e animais e reconstruir um Estado do tamanho de um grande país da Europa, que está simplesmente com mais de 80% da sua superfície debaixo d’água.
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Por mais superpoderes que tenham os seus bilionários de estimação, nenhum deles está apto ou legitimado para executar uma tarefa desta proporção.
Quando a realidade exibe os limites da ação individual, vide pandemia e agora inundações, a extrema direita precisa rever sua forma de comunicar e não tendo as respostas que permitem a construção da vidraça, os radicais seguem sendo a única coisa que sabem ser: pedras atiradas com fins unicamente iconoclastas.
* Alexandre Gossn é escritor, investigador colaborador & doutorando na Universidade de Coimbra e autor de “Santo Adamastor”.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião dO Grupo Perfil Brasil
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