A discussão sobre a iniciativa do governo do Paraná de transferir a gestão de escolas públicas para a iniciativa privada mudou de cenário. Com a aprovação do Programa Parceiro da Escola pelo legislativo estadual e a sanção pelo governador Ratinho Junior, a questão agora está no Supremo Tribunal Federal (STF), onde nove deputados estaduais contrários ao programa apresentaram uma reclamação constitucional.
Segundo o gabinete da deputada estadual Ana Júlia (PT), a reclamação foi apresentada na terça-feira (4) e está sob a relatoria do ministro Nunes Marques.
Os opositores alegam que a tramitação do projeto na Assembleia Legislativa violou normas internas, pois não passou pela Comissão de Finanças e Tributação para verificar sua conformidade com a Lei de Responsabilidade Fiscal e as leis estaduais de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Orçamentária Anual (LOA).
A oposição também argumenta que a concessão da gestão de escolas públicas à iniciativa privada resulta na terceirização da atividade-fim das escolas, prejudicando a autonomia e a liberdade de cátedra dos professores.
Além disso, eles afirmam que “a privatização da gestão das escolas públicas está sendo feita sem a participação da sociedade” e que esse modelo de gestão pedagógica não está em conformidade com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Eles também afirmam que a medida “burla concursos públicos“.
Administrativo x pedagógico
“A divisão da gestão da escola em três áreas: financeira, estrutural e pedagógica, com a gestão administrativa prevalecendo sobre todas, inclusive coordenando o pedagógico, é uma preocupação. O uso do termo ‘poderá’ para a utilização de plataformas de ensino é impreciso, permitindo que se não quiserem, não utilizem, retirando a autonomia dos professores para dar aula”, argumentou a deputada.
“Sem a autonomia dos professores, as escolas podem ser ideologizadas, com profissionais efetivos tendo que atender critérios e metas estabelecidos pela empresa.”
Em resposta à Agência Brasil, o governo do Paraná defendeu a constitucionalidade do projeto. “Não se trata de privatização ou terceirização da atividade-fim, já que a gestão pedagógica permanece sob responsabilidade do estado. Não há interferência na liberdade de cátedra ou mudanças sobre concursos públicos”, afirmou a assessoria do governador, destacando que mais de 2 mil professores aprovados em concurso público foram convocados em 2024.
Projeto-piloto
A assessoria jurídica da deputada Ana Júlia observa que o texto sancionado prevê a contratação de professores caso o quadro seja insuficiente, o que já ocorre nas duas escolas onde o projeto-piloto está sendo implementado – Escola Anibal Khury Neto e Escola Anita Canet.
De acordo com a assessoria, a Escola Anibal Khury Neto tem atualmente 14 professores concursados e 27 terceirizados, enquanto a Escola Anita Canet tem 8 professores concursados e 28 contratados. Além disso, observou-se um aumento na taxa de desistência na Escola Anita, de 3% para 5% desde a implementação do programa. Na Escola Anibal, essa taxa diminuiu de 5% em 2022 para 1,5% em 2023.
Há também denúncias de que professores estariam sendo pressionados a manipular dados e notas para favorecer o uso do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em discursos pró-terceirização. “Isso compromete a credibilidade do Ideb, uma vez que há suspeitas de alteração nos registros de frequência, taxa de evasão e notas”, informou a assessoria jurídica de Ana Júlia.
Governo rebate
O governo do Paraná, por sua vez, afirma que as escolas apresentaram “melhoras significativas” nos índices de matrículas, frequência e desempenho escolar entre 2023 e 2024.
“No Colégio Estadual Anita Canet, o número de alunos matriculados aumentou de 895 para 965, um crescimento de 8%. A frequência dos alunos subiu de 84% para 88%”, informou a assessoria do governador. A média de acertos dos alunos também aumentou de 41% em 2022 para 45% em 2023.
“No Colégio Estadual Anibal Khury, o número de alunos cresceu de cerca de mil em 2020 para 1.141 em 2024. A frequência passou de 85% em 2022 para 87% em 2023”, detalhou o governo.
Outro dado apresentado foi a redução no número de aulas vagas devido à ausência de professores. “Em 2022, 22% das aulas não foram realizadas. Em 2023, esse número caiu para 6%”.
O governo estadual também citou uma pesquisa com pais e responsáveis nas duas escolas, onde a aprovação do modelo superou 90%. “No Anita Canet, 96% da comunidade aprovou o modelo, e 93,1% estão satisfeitos ou muito satisfeitos com a parceria. No Anibal Khury, 90% aprovam, e 81,6% dos pais e responsáveis estão satisfeitos ou muito satisfeitos.”