Em 20 de junho de 1963, inaugurou-se a linha direta Moscou-Washington, nos Estados Unidos, o chamado “telefone vermelho”. Na verdade, o aparelho nunca teve essa cor: foi nomeado assim para indicar sua urgência. Em plena Guerra Fria e diante da animosidade prevalecente entre as duas superpotências, os Estados Unidos e a União Soviética conseguiram ter um canal de diálogo instantâneo (nada fácil para aqueles tempos) que evitaria erros de cálculo, incertezas e, portanto, um conflito militar com consequências devastadoras. O poder nuclear de ambos os países prometia uma “Destruição Mútua Assegurada” (MAD, pela sigla em inglês) em caso de guerra. Felizmente para a humanidade, essa guerra nunca veio.
Apesar das profundas diferenças ideológicas, políticas, econômicas e culturais – somadas ao conflito estrutural que caracterizou aquele período histórico – as duas potências sempre tiveram um canal de diálogo. O “telefone vermelho” foi usado quando Kennedy foi assassinado em 1963, durante a Guerra dos Seis Dias entre Israel e Egito em 1967, durante a guerra entre Índia e Paquistão em 1971, na Guerra do Yom Kippur entre Egito e Israel em 1973, durante a intervenção turca no Chipre em 1974 e na invasão soviética do Afeganistão em 1979, para citar apenas alguns exemplos.
Atualmente, estamos testemunhando uma nova bipolaridade emergente, muito diferente da Guerra Fria. O conflito sino-americano é, sem dúvida, um eixo (des)ordenador das relações internacionais, mas agora em um contexto de forte interdependência mútua e globalização.
Entrando na terceira década do século 21, ao medo renovado da MAD acrescentam-se mais dois fantasmas que pairam sobre Washington e Pequim e o mundo como um todo: os dois MAEDs (siglas em inglês). Referimo-nos à “Destruição Mútua Econômica Assegurada” e “Destruição Mútua Ecológica Assegurada”. A primeira é um limite para a tese do “desacoplamento” entre as duas principais economias do mundo. Se concretizada, os efeitos econômicos para ambas as nações, os atores privados e a economia internacional seriam profusos. A segunda, e mais importante, é um limite ambiental para a própria noção de futuro. Sem a participação ativa das duas superpotências na reposta às Mudanças Climáticas (são os dois atores estatais com as maiores emissões de CO2), não há nenhuma possibilidade de o mundo alcançar compromissos efetivos nesta área. Só com Washington e Pequim não basta, evidentemente, mas sem eles é impossível. Qualquer esforço multilateral se enfraquece e perde sentido.
Nesse contexto, para o futuro da humanidade e para evitar uma longa e agonizante catástrofe planetária, é fundamental que os Estados Unidos e a China estabeleçam um canal de diálogo direto, um “Telefone Verde”. Tudo parece indicar que, deixando para trás o negacionismo do governo Trump, esse canal de diálogo vital já tem um início incipiente, apesar do contexto de hostilidade bilateral. Enquanto em março passado, no Alasca, Antony Blinken e Wang Yi elevaram o tom, em Xangai, o enviado especial de Biden para o clima, John Kerry, dialogou cordialmente com as autoridades chinesas sobre a necessidade de enfrentar conjuntamente as mudanças climáticas.
O recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) alerta que os prazos para ação estão se esgotando. A rivalidade sistêmica e a disputa pelo poder global não devem impedir que os Estados Unidos e a China estabeleçam uma “parceria de rivais” onde possam cooperar em áreas críticas. Será este um século chinês? Será finalmente um novo século americano? Sem cooperação climática, não será de ninguém.
*Por Esteban Actis – Doutor em Relações Internacionais.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.
*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.