perigos quando a verdade pertence a um só

Os líderes supremos

*Por Felipe Frydman – Diplomata.

Os líderes supremos
(Crédito: Getty Images)

A glorificação de Xi Jinping mostra mais uma vez a paixão da esquerda pelos líderes supremos. Até algumas décadas atrás, Fidel Castro era o exemplo de sua capacidade de liderança e seus julgamentos infalíveis; exerceu notável carisma e seus discursos provocaram emoções. Intelectuais dedicaram horas ao seu estudo para entender o significado de suas palavras. Mais tarde foi substituído por Hugo Chávez, que também passou horas diante do microfone como um oráculo revelando a verdade. O Congresso do PC chinês, por unanimidade, acaba de elevar Xi Jinping e seu pensamento ao mais alto nível para liderar a nação, seu povo e o mundo em direção ao socialismo.

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A Revolução de Outubro levantou Vladimir Lenin e Leon Trotsky, cujas intervenções nos sovietes foram decisivas para decidir o curso dos acontecimentos. A morte prematura de Lenin abriu caminho para Josef Stalin, que permaneceu no poder até sua morte em 1953. Em 24 de fevereiro de 1956, Nikita Khrushchev no XX Congresso do PC denunciou as atrocidades cometidas por Stalin e o culto à personalidade durante trinta anos de seu governo. Naqueles tempos, Stalin era insuperável, foram encontrados até argumentos para justificar o Pacto Ribbentrop-Molotov, que fornecia alimentos e petróleo às tropas de Hitler para facilitar a invasão da Europa Ocidental sem se preocupar com a retaguarda.

A biografia de Mao Zedong foi reescrita após sua morte. O golpe de 1976 acabou com a Revolução Cultural e os responsáveis ​​foram presos, incluindo Jiang Qing, cuja morte na prisão em 1991 foi considerada suicídio por enforcamento. O desaparecimento de Mao permitiu a ascensão de Deng Xiaoping, a implementação de reformas e a aproximação com os Estados Unidos, o que abriria caminho para o desenvolvimento e tornaria a China a segunda potência econômica.

Em todos esses casos, o aparelho estatal funcionou como uma máquina de propaganda para martelar a bondade do líder e sua dedicação ao povo. Não havia espaço para discordância e os dissidentes desapareceram ou foram cancelados, na melhor das hipóteses. O objetivo era mostrar uma sociedade coesa que aceitasse a liderança com indiferença e aplaudisse cada aparição e ocorrência do supremo sem a possibilidade de questionar suas ordens. A consciência da sociedade foi substituída pelos slogans amplificados por todos os meios de comunicação.

Os resultados desses regimes unipessoais e de partido único são fáceis de prever, mesmo que demore até a morte física, como aconteceu com Stalin e Mao Zedong, para que os sucessores tenham a coragem de divulgar a realidade. Isso também acontecerá com Fidel Castro quando a família for substituída por uma nova geração disposta a mudar de rumo, como aconteceu com a União Soviética em 1956 e a China em 1976.

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O partido único sempre ocupou um papel central na literatura de esquerda porque facilita a centralização do processo de definição da ação política. Xi Jinping voltou a insistir no papel do Partido Comunista como a espinha dorsal do sistema político, rejeitando o sistema multipartidário reverenciado no Ocidente como forma de canalizar as diferentes opiniões que geralmente são encontradas em qualquer sociedade. O partido único apresenta-se como uma estrutura de baixo para cima quando na realidade funciona sempre ao contrário, para garantir a obediência. Não é coincidência ou surpresa que em países de partido único todos falem a mesma língua.

A história destes últimos cem anos deixou o mesmo ensinamento sobre os riscos dos altos dirigentes com um controle indiscutível do poder. Os exemplos são os mesmos da direita, com Hitler e Mussolini, onde se repetiram os esquemas com finais trágicos que envolveram toda a humanidade. No entanto, apesar das evidências, é surpreendente que ainda haja quem expresse sua admiração por essa forma de governo, desprezando as virtudes da democracia, deliberações e controles entre os poderes para evitar justamente os perigos envolvidos quando a verdade pertence a um só.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

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*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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