Sistema Cantareira entra em segundo período de maior seca desde a crise hídrica

O Sistema Cantareira registrou 50,8% de volume, 10% a menos em comparação a 2013, ano de pré-crise hídrica, quando o volume era de 62,8%

Sistema Cantareira entra em segundo período de maior seca
Sistema Cantareira (Crédito: Fernanda Carvalho/ Fotos Públicas)

O primeiro quadrimestre de 2021 entrou para a história do Sistema Cantareira como o período que registrou os menores volumes de água desde a crise hídrica de 2014 a 2016, que gerou graves problemas sociais e econômicos em toda a região metropolitana de São Paulo. O Sistema abastece cerca de 7,6 milhões de pessoas na região metropolitana do estado, além de Campinas e Piracicaba. “O volume do Sistema Cantareira segue abaixo do volume da pré-crise hídrica em 2013 com tendência de queda”, alerta Alexandre Uezu, coordenador do Projeto Semeando Água, iniciativa do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas com apoio da Caterpillar Foundation.

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Em 30 de abril de 2021, o Sistema registrava 50,8% de volume, 10% a menos em comparação a 2013, ano de pré-crise hídrica – quando o volume era de 62,8%. “Em 2013, em abril, choveu o equivalente a 70% da média histórica, já em 2021 apenas cerca de 10%”, destaca Uezu.  Nos 10 primeiros dias de maio, o Sistema Cantareira reforçou a tendência de queda, com índices mais baixos de precipitação.

“Com o término do período das chuvas – março/ abril, temos cinco meses pela frente da época mais seca na região – até setembro. Depois da crise hídrica, 2015 e 2016 a quantidade de chuvas ficou próxima à média histórica, mas a partir de 2017 a precipitação anual média tem ficado abaixo.”, destaca Uezu.

“Em abril, o Sistema Cantareira registrou apenas 10,8% do volume esperado de chuvas para o mês. Pela média histórica, abril costumava registrar 83.1 mm de chuva, mas neste ano choveu apenas 9 mm”

Um dos grandes desafios para reverter este quadro inclui o plantio de 35 milhões de árvores apenas nas áreas próximas às nascentes e aos cursos d’água (chamadas APPs hídricas – Áreas de Preservação Permanente), uma vez que 60% delas estão desmatadas, segundo o Atlas do Sistema Cantareira, elaborado pelo IPÊ, que já plantou na região 370 mil mudas de árvores nativas da Mata Atlântica, em conjunto com a iniciativa privada e com pessoas físicas. 

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Outra ação importante, além das árvores, em uma paisagem onde os reservatórios correspondem a apenas 3% da área da região, é a melhoria do uso do solo para gerar segurança hídrica.

“Quando a água da chuva encontra as condições necessárias para infiltrar ela é liberada aos poucos, em especial nos períodos de estiagem, como esse que estamos começando a enfrentar. No cenário atual, a gente ainda desperdiça a água da temporada de chuva, por conta da degradação do solo: quando ela cai, não consegue infiltrar. Além desse desafio, a tendência de aumento de eventos extremos, como a seca prolongada, efeito da emergência climática vivenciada no mundo, é um alerta a mais para a região”, completa Alexandre.  

Se por um lado a área dos reservatórios é inferior a 5%, as pastagens degradadas se aproximam dos 45%. Segundo o Atlas do Sistema Cantareira, publicação do IPÊ, 46% da região é ocupada por pastagens em geral degradadas e outros usos. Esses outros usos se referem às áreas urbanizadas, mas elas correspondem a apenas 2% do total. Em comum, áreas degradadas e urbanizadas são impermeabilizadas e não contribuem com a segurança hídrica do Sistema, uma vez que a água não infiltra adequadamente no solo. 

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Como o projeto Semeando Água ajuda na melhoria do solo 

É possível transformar parte dessa realidade, recuperando as áreas degradadas, cerca de 100 mil hectares, e torná-las aliadas da segurança hídrica. Manejo de pastagem ecológica, agrofloresta, silvicultura de nativas, sistema silvipastoril estão entre as práticas implementadas pelo projeto do IPÊ.

“A escolha por esses sistemas produtivos está relacionada à produção na região. Dessa forma nos aproximamos dos proprietários rurais com soluções sustentáveis e economicamente inclusivas”, completa Uezu. 

Desde 2020, por conta do isolamento social, o Projeto Semeando Água tem focado na integração entre os sistemas produtivos, como a inclusão de sistema silvipastoril em áreas de manejo de pastagem ecológica e na agrofloresta alinhada à silvicultura de nativas, além de otimizar a análise de dados. “Com essas práticas fortalecemos o aumento de renda e assim contribuímos com a permanência dos proprietários rurais no campo; essencial para a segurança hídrica tanto de quem está na região provedora de água quanto na área beneficiada por esse recurso. Quanto aos dados, já avançamos em 80 hectares com sistemas produtivos sustentáveis”.

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Potencial agravante

No campo, assim como na cidade, quem também marca presença é a especulação imobiliária. No entanto, no campo, a transformação de sítios e fazendas em condomínios de casas aumenta a área impermeabilizada em uma região provedora de água para milhões de pessoas. 

A força do consumidor

O consumidor também tem a oportunidade de contribuir com a própria segurança hídrica quando escolhe consumir alimentos dos produtores locais. “Afinal, quem produz alimentos de forma sustentável é também produtor de água. Quando o consumidor faz essa opção de dar preferência aos alimentos produzidos por produtores da região do Sistema Cantareira, ele apoia os negócios desse produtor e assim soma esforços com a própria segurança hídrica”, completa Uezu.

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O desafio é de todos

O projeto Semeando Água atua com base em Políticas Públicas para o desenvolvimento territorial, buscando a construção do entendimento sobre a necessidade de inclusão da região do Sistema Cantareira entre as prioridades do estado, considerando a sua importância no contexto da conservação de um valioso reduto de Mata Atlântica e suas riquezas associadas, alinhadas às questões de clima que devem ser consideradas, principalmente no contexto de segurança hídrica.

Avanços de um planejamento de fato integrado, entre os municípios provedores e seus beneficiários, têm o potencial de inserir a região em um novo patamar de desenvolvimento, como explica Simone Tenório, coordenadora de Políticas Públicas do Projeto Semeando Água. “É possível nos adaptarmos regionalmente para construção de uma nova economia, contando com os esforços público-privados e a formação de um grupo intersetorial, que pode impulsionar um crescimento resiliente e com soluções baseadas na natureza no desenho da paisagem. A integração dos diversos setores pode caminhar em direção à construção dessa economia positiva, criando oportunidades inovadoras. As escolhas para o desenvolvimento econômico podem seguir essas novas perspectivas, consideradas em nível mundial como alavancas ao crescimento.”

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