Em entrevista à BBC, a pesquisadora do departamento de Saúde e Sociedade da Universidade de São Paulo (USP) Claudia Moreno explica que ao trabalhar à noite, ocorre uma inversão do padrão natural de atividade e repouso.
Isso porque o ciclo circadiano, sistema temporal interno do nosso organismo chamado popularmente de relógio biológico, é alinhado com a alternância entre o dia e a noite, o claro e o escuro. “Assim como a coruja é habituada com a noite, o ser humano é com o dia“, afirma.
A pesquisadora afirma que, em regra, essa inversão teria que ocorrer também com o padrão de todas as funções do organismo, como a liberação de hormônios e as enzimas que auxiliam na digestão. Porém a velocidade de ajuste ao “novo” horário não ocorre da mesma forma para todas as funções do organismo.
“A temperatura corporal, por exemplo, leva dias para alterar seu padrão, isto é, a pessoa trabalha com a temperatura do corpo adequada para dormir e não para exercer qualquer atividade“, diz Moreno.
Quais os impactos na saúde?
O sono do trabalhador noturno é afetado de diversas maneiras, uma vez que o sono durante o dia é de qualidade inferior e muitas vezes é mais curto, o que pode levar a um déficit. Isso ocorre porque o estilo de vida diurno não se adapta ao horário de trabalho noturno, resultando em menos horas de sono e sono de pior qualidade.
A Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) recomenda que um adulto precisa de seis a oito horas de sono por dia. Porém, os trabalhadores noturnos tendem a dormir menos devido às demandas sociais durante o dia.
Essa falta de sono adequado resulta em cochilos involuntários, sensação de cansaço e desânimo. Além disso, os trabalhadores noturnos frequentemente dividem seu sono em dois ou mais períodos durante o dia, o que contribui para um déficit a longo prazo.
“Com isso, essa pessoa continuará com um débito de sono, que a longo prazo contribui para o desenvolvimento de doenças, como a insônia“, diz Moreno.
Doenças cardiovasculares, distúrbios gastrointestinais e metabólicos (como diabetes tipo 2 e síndrome metabólica), cânceres (como de mama, próstata e colorretal), problemas de saúde mental e questões relacionadas à reprodução também têm maiores chances de serem desenvolvidas.
Ada Ávila Assunção, professora de saúde pública da UFMG, explica à BBC que isso ocorre porque o corpo enfrenta o paradoxo de precisar funcionar quando está em baixa produção de elementos fundamentais para essas funções.
“Para se ter uma ideia, estudos mostram que enfermeiras que trabalham à noite durante ao menos dois anos apresentam 81% mais risco de desenvolver hipertensão arterial quando comparadas àquelas que trabalham durante o dia“, ressalta Assunção.