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A Sociedade da Neve: veja como é a verdadeira história por trás do filme

‘A Sociedade da Neve’ chega à Netflix na quinta-feira, 4, e narra uma das maiores catástrofes da América do Sul: a Tragédia dos Andes

Imagine o cenário brutal: um avião transportando 45 pessoas — incluindo uma equipe de rugby e alguns amigos e familiares — cai em uma parte remota dos Andes, matando grande parte dos que viajavam.

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Os sobreviventes ainda permaneceriam isolados por mais de dois meses no clima inóspito e frio da região, precisando até mesmo se alimentar de carne humana para sobreviver. Por mais que pareça roteiro de filme, esse foi um acontecimento real que chocou toda a América do Sul: a Tragédia dos Andes.

Era 13 de outubro de 1972 quando o Voo Força Aérea Uruguaia 571 caiu, dando início a um dos maiores e mais brutais feitos de sobrevivência da história recente da América do Sul. A história é tão chocante que já inspirou até mesmo filmes, como ‘Vivos’ (1993), de Frank Marshall, e o documentário ‘A Sociedade da Neve’ (2008), do uruguaio Gonzalo Arijón.

Restos do avião que caiu nos Andes em 1972 / Crédito: Foto por Wunabbis pelo Wikimedia Commons
Restos do avião que caiu nos Andes em 1972 / Crédito: Foto por Wunabbis pelo Wikimedia Commons

Em 15 de dezembro de 2023, um novo filme sobre a tragédia chegou aos cinemas da Espanha e dos EUA, recebendo também o título ‘A Sociedade da Neve’ — em referência ao livro de 2008 de Pablo Vierci, jornalista e amigo dos sobreviventes, além de produtor do novo longa —, dirigido pelo espanhol Juan Antonio Bayona. Agora, o filme foi disponibilizado pela Netflix.

Tragédia dos Andes

Conforme descrito pela BBC Internacional, o avião que caiu nos Andes no fatídico outubro de 1972 contava com 45 pessoas a bordo, incluindo o time de rugby Old Christians Club e alguns amigos e familiares da equipe. O voo partiu de Montevidéu, capital do Uruguai, com rumo a Santiago, no Chile, para uma competição em que jogariam contra uma equipe inglesa.

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No entanto, como revelaram as investigações posteriores, a aeronave colidiu contra as montanhas dos Andes, pois, os pilotos acreditaram que estavam mais perto do aeroporto de Pudahuel, no Chile, do que realmente estava.

Vale destacar que eles enfrentaram fortes ventos. Conforme repercutido pela ABC News, a aeronave não conseguiu alcançar os 26.000 pés necessários para seguir trajeto diretamente na cordilheira. Assim, seguiram uma rota em forma de U, sendo capazes de voar mais baixo numa passagem da montanha, explicou ao veículo internacional John Nance, especialista em aviação.

Seguindo a autorização do controle de tráfego aéreo, iniciaram a descida. Mas, não notaram que se precipitaram. Como resultado, acabaram no coração da Cordilheira dos Andes. Por não conseguir ultrapassar a cordilheira, o avião colidiu com uma montanha.

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Com o drástico impacto, o avião perdeu as asas e parte da cauda. A princípio, 33 pessoas sobreviveram ao acidente, mas o grupo ainda tinha o que enfrentar.

Imagem de divulgação de 'A Sociedade da Neve' (2023) / Crédito: Divulgação/Netflix
Imagem de divulgação de ‘A Sociedade da Neve’ (2023) / Crédito: Divulgação/Netflix

A mais de 3 mil metros de altitude, sob frio de até -30 ºC à noite, sem mantimentos ou remédios, os sobreviventes precisaram encontrar as mais diferentes formas possíveis para superar os dois maiores empecilhos da localidade em que estavam: o frio e a fome.

No entanto, não demorou até que autoridades os determinassem como desaparecidos e mortos, considerando-se o quão inóspito era o ambiente, sem mencionar a própria dificuldade de se sobreviver a uma queda de avião.

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Por isso, os sobreviventes acabaram presos ao local da queda durante mais de 70 dias. No decorrer desse tempo, o número de sobreviventes foi diminuindo e, para sobreviver, aqueles que restavam precisaram apelar para o inimaginável: alimentaram-se dos cadáveres dos que já haviam morrido.

Os sobreviventes chegaram a drástica decisão após um pacto coletivo. Em conversa, eles concordaram que, caso não resistissem, os seus restos mortais poderiam ser usados para que outros sobrevivessem até o resgate.

Ainda durante a luta por sobrevivência, uma avalanche destruiu a fuselagem do avião. O episódio resultou na morte de oito pessoas, que acabaram ‘engolidas’ pela neve.

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Foi somente no 72º dia que dois dos sobreviventes, Fernando Parrado e Roberto Canessa, decidiram partir definitivamente pela serra, sem os equipamentos de caminhada adequados, para tentar obter ajuda.

Depois de 10 dias vagando pela neve, eles encontraram um grupo de agricultores chilenos — entre eles Sérgio Catalán, que atravessava com seus animais num trecho inóspito da cordilheira dos Andes —, que os socorreram, bem como ajudaram no pedido de socorro para as outras vítimas. No final, de todas as 45 pessoas a bordo do avião, somente 16 foram resgatadas, incluindo Parrado e Canessa.

+ Canibalismo e desespero: Roberto Canessa, um dos sobreviventes da Tragédia nos Andes

Fernando Parrado (Agustín Pardella) e Roberto Canessa (Matías Recalt) em 'A Sociedade da Neve' / Crédito: Divulgação/Netflix
Fernando Parrado (Agustín Pardella) e Roberto Canessa (Matías Recalt) em ‘A Sociedade da Neve’ / Crédito: Divulgação/Netflix

Uma história humana

Nas palavras de Juan Antonio Bayona à BBC Culture, o novo ‘A Sociedade da Neve’ “é uma história horrível que nunca é focada no terror”. Isso porque, por mais que seja angustiante, fascinante e até resulte em nojo para as pessoas pensarem na ideia do canibalismo como uma necessidade para a sobrevivência, esse elemento não é central no filme.

A forma como abordamos a história é exatamente o oposto. É focada no aspecto humano da história e na amizade, na extrema generosidade que eles tiveram um com o outro.”

Cena de sobreviventes com destroços do Voo Força Aérea Uruguaia 571 no novo filme / Crédito: Divulgação/Netflix
Cena de sobreviventes com destroços do Voo Força Aérea Uruguaia 571 no novo filme / Crédito: Divulgação/Netflix

A “generosidade” que Bayona menciona, no caso, se refere principalmente ao pacto estabelecido entre muitos dos sobreviventes iniciais, que ofereceram seus próprios corpos aos demais, caso falecessem durante a espera por resgate.

“Fiz muitas entrevistas com eles, e na época eram crianças que estudavam na faculdade, alguns faziam medicina ou direito, alguns eram religiosos, outros não”, descreve o diretor à BBC Culture. “Temos essa cena no filme que é uma longa conversa que eles têm sobre usar ou não os corpos, e é baseada nas conversas reais que tivemos com eles.”

Cena de 'A Sociedade da Neve' / Crédito: Divulgação/Netflix
Cena de ‘A Sociedade da Neve’ / Crédito: Divulgação/Netflix

Dignidade

Antes das filmagens, Bayona chegou a visitar o Vale das Lágrimas, nos Andes, onde o avião caiu, e por isso teve, pelo menos, uma pequena ideia do sufoco que os sobreviventes precisaram passar para aguentar. “Embora não tenha sentido frio porque estava com meu saco de dormir na barraca, estava protegido, quando acordei de manhã minha garrafa de água era um pedaço de gelo”, comenta o diretor.

“Como não tive aquele terceiro dia para me acostumar com a altitude, tive a pior noite de todas. Meu coração batia super rápido o tempo todo, fiquei confuso e fora de mim (…) E eu pensei: ‘Isso é só uma noite para mim, essas pessoas passaram mais de 70 noites aqui, estavam com roupas inadequadas, não estavam preparadas’. Então isso coloca você no contexto de quão grande era a situação, quão épico foi sobreviver 72 dias nessas condições.”

*Texto originalmente publicado em Aventuras na História 

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