Opinião

O que acontece quando as mulheres chegam ao poder?

*Por Karolina Gilas – Faculdade de Ciências Políticas e Sociais da Universidade Nacional Autônoma do México. Rede de Cientistas Políticos (@KarolinaGilas).

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Rainha Elizabeth II (Crédito: Geoff Pugh – WPA Pool /Getty Images)

Quando as mulheres chegam ao poder, surgem expectativas de que a política mude e se torne mais amigável e conciliadora, que as sociedades se tornem mais igualitárias e pacíficas. Essas expectativas refletem estereótipos de gênero, associando as mulheres a certas qualidades: ainda hoje acredita-se que elas são mais conciliadoras, amáveis, dispostas a ouvir e levar em conta diferentes pontos de vista, que sabem cuidar melhor de si mesmas do que os homens. Assim, espera-se que as políticas sejam responsáveis ​​por reparar nossas sociedades e resolver os problemas de exclusão, desigualdade e pouca representatividade.

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Alguns estudos mostraram que, de fato, as mulheres tendem a lidar mais do que os homens com questões ou expressar posições “igualitárias”. Por exemplo, elas apoiam com mais frequência a legislação em favor de mudanças nos papéis de gênero, passam mais tempo servindo a comunidade e mais frequentemente levam em consideração as opiniões dos cidadãos e se preocupam em estabelecer vínculos com seus eleitores. Da mesma forma, demonstrou-se que seu estilo de governo enfatiza a busca por coincidências e cooperação, características geralmente associadas a um exercício de poder “feminino”.

Então, as mulheres são capazes de mudar o mundo? Sua presença na política a torna melhor?

A ciência política acreditava que era necessário atingir uma “massa crítica” da presença feminina para aumentar sua influência nas políticas públicas e permitir que influenciem o conteúdo das decisões. Com isso, parlamentos com maior presença feminina devem aprovar mais leis com perspectiva de gênero e gerar condições favoráveis ​​para a inclusão de mais mulheres nos partidos e na administração pública. Isso, por sua vez, seria um empurrão para promover a igualdade social.

No entanto, a realidade dos países em que a presença das mulheres nos espaços de poder aumentou significativamente é muito mais complexa. Em alguns casos, observou-se que as mulheres nos níveis mais altos do exercício do poder possuem formações, experiências, atuação e projetos políticos indistinguíveis dos homens. Frequentemente, as mulheres aderem à agenda do partido em primeiro lugar, dedicando seus maiores esforços para alcançar objetivos comuns, deslocando a agenda de gênero e igualdade. Inclusive, foram identificados casos em que o aumento significativo da representação feminina gerou retrocessos nas políticas públicas de igualdade.

Isso se deve às diferenças que existem entre as mulheres e ao fato de nem todas aderirem à agenda de gênero, uma vez que suas preferências ideológicas ou vínculos partidários são determinantes para suas posições políticas. O fato de ser mulher não acarreta nem uma experiência de vida única nem a mesma preferência por políticas públicas. As mulheres que chegam ao poder não necessariamente defendem questões feministas, mas muitas vezes se adaptam às regras existentes no mundo da política “androcêntrica” ​​(e às vezes essas regras são tão fortes que não têm escolha). Finalmente, esperar que as mulheres que venham a ocupar cargos de decisão se dediquem exclusivamente às questões “femininas” e tenham a responsabilidade exclusiva de reparar nossas sociedades torna-se um novo mecanismo de discriminação.

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Apesar de tudo isso, a presença das mulheres nos espaços de poder tem um valor em si. É importante, simplesmente porque numa democracia não se pode aceitar a exclusão de metade da população do exercício do poder. É valioso, porque melhora a representatividade das instituições políticas, promove a pluralidade e diversidade de interesses, opiniões e posições. É necessário, porque uma democracia sem mulheres não é uma democracia.

A presença igualitária das mulheres no poder é necessária não porque elas devam mudar o mundo, mas para ter as mesmas oportunidades de fazê-lo.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

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*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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