ESCÂNDALO RELIGIOSO

O que se sabe sobre a filha que denunciou abusos do pai, líder de uma grande igreja?

Aos sete anos, Ajoke, filha do pastor Temitope Balogun Joshua, chegou a sofrer agressão por urinar na cama e foi obrigada a andar com uma placa que dizia “faço xixi na cama”

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Temitope Balogun Joshua – Crédito: Reprodução/Youtube

Ajoke, filha do pastor Temitope Balogun Joshua (1963-2021), o qual é acusado de crimes sexuais em massa ao longo de duas décadas, contou em detalhes à BBC sobre os anos de tortura que sofreu nas mãos de seu pai. Também conhecido como T.B. Joshua, ele era líder de uma grande igreja denominada Igreja Sinagoga de Todas as Nações (Scoan) e faleceu aos 57 anos em 2021. Sua filha foi uma das primeiras a relatar os casos de abuso que testemunhou na congregação de seu pai na Nigéria.

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Porém, há pouca informação sobre a mãe biológica de Ajoke. Mas acredita-se que ela seja membro da igreja de T.B. Joshua. Ajoke relata que Evelyn, a viúva de Joshua, a criou. Ainda, se recorda que teve uma infância feliz até os sete anos. No entanto, tudo mudou abruptamente quando foi suspensa da escola e um jornalista local a mencionou como filha ilegítima de T.B. Joshua em uma reportagem. Isso resultou em sua retirada da escola e sua transferência para o complexo da igreja Scoan, em Lagos.

O início dos abusos 

Ajoke conta que seu pai a forçou a se mudar para o quarto dos discípulos, um grupo de seguidores que servia T.B. Joshua e morava com ele no complexo por décadas. “Os discípulos sofriam lavagem cerebral e eram facilitadores. Todos agiam simplesmente sob comando, como zumbis. Ninguém questionava nada”, afirma. Os seguidores aderiam a um conjunto estrito de regras. Entre elas, haviam limitações rigorosas de sono, a proibição do uso de seus próprios telefones e a restrição de acesso a e-mails pessoais. Além disso, era obrigatório que se referissem a T.B. Joshua como “papai”.

Só que Ajoke não respeitava essas regras, o que desencadeou os abusos. Como exemplo, ela relatou que aos sete anos chegou a sofrer agressão por urinar na cama e foi obrigada a andar com uma placa que dizia “faço xixi na cama”. Além disso, os abusos físicos que ela sofria receberam o aval de seu pai para que também fossem cometidos por terceiros. “Certa vez, nas reuniões dos discípulos, ele [Joshua] disse que as pessoas podiam bater nela. Qualquer pessoa do dormitório feminino podia simplesmente bater nela e eu me lembro de observar pessoas dando tapas nela quando ela passava”, conta Emmanuel, um ex-discípulo que fez parte da igreja ao longo de 21 anos.

O confronto ao líder de uma grande igreja

Por volta de seus 17 anos, depois de ouvir relatos variados de pessoas que diziam ter sofrido sofrido abusos sexuais, ela resolveu confrontar T.B. Joshua. Todavia, Ajoke conta que “eram muitas pessoas dizendo a mesma coisa” e que ela também via discípulas que subiam até o quarto de seu pai e ficavam por lá ao longo de horas. Vale ressaltar que a BBC entrevistou mais de 25 ex-discípulas provenientes do Reino Unido, Nigéria, EUA, África do Sul, Gana, Namíbia e Alemanha, que forneceram relatos confirmando terem experimentado ou testemunhado casos de abusos sexuais.

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A filha do líder conta, em resumo, que não tinha mais medo de seu pai e não aguentava mais aquela situação. “Entrei diretamente no seu escritório naquele mesmo dia. Gritei o mais que pude: ‘por que você está fazendo isso? por que você está fazendo todas essas mulheres sofrerem?'”, relembra.

Diante do confronto, seu pai a colocou em um quarto mais distante dos demais membros, onde ficou confinada por mais de um ano. Segundo a igreja, essa punição era conhecida como “adaba”. Nesse período, Ajoke sofreu abusos físicos com cintas e correntes. “Eu ficava dias sem conseguir nem me levantar após os espancamentos. Não conseguia nem tomar banho. Ele tentava de tudo para impedir as pessoas de me ouvirem.”, conta.

A expulsão de Ajoke e a verdade sobre a Scoan

Aos 19 anos, a filha de T.B. Joshua foi levada até os portões da igreja e abandonada, seis anos antes de seu pai morrer. O líder religioso, contudo, ordenou aos seguranças para que eles não permitissem seu retorno. Ajoke passou muitos anos nas ruas e buscou a BBC inicialmente em 2019 para relatar os abusos.

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Antigos discípulos, como Emmanuel, contam que o comportamento de Ajoke em relação a seu pai levou alguns membros a questionarem sua própria devoção. “Ele nos mantinha em escravidão, total e absoluta escravidão. Ajoke teve ousadia suficiente para confrontá-lo. Eu a considero uma heroína”, declara ele.

“Perdi tudo, minha casa, minha família, mas, para mim, o importante é a verdade. E, enquanto houver um sopro de vida em mim, irei defendê-la, até o fim.”, conclui Ajoke. Hoje, seu maior sonho é retornar à escola e concluir sua formação.

 * Sob supervisão de Lilian Coelho

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