O legado de Paulo Freire

A História mostra diferentes modelos de Educação, porém, o cuidado para com esta formação sempre ocorreu e continua a ocorrer, por isso, ao se falar de Educação de uma nação, fala-se de um dos pilares responsáveis pela sua existência e preservação da própria identidade

O legado de Paulo Freire
(Crédito: Denise Queiroz/ Secom Educação)

As respectivas culturas inerentes às diferentes civilizações, do passado e do presente, carregam legados deixados por personagens que se diferenciaram nas sucessivas gerações. Foi assim com a civilização egípcia, com a hebraica, persa, chinesa, grega, romana e árabe, dentre outras, e continua a ser do mesmo modo nos dias atuais.

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Cada uma das pessoas distinguidas, marcou sua identidade, de acordo com princípios e valores de sua própria cultura, em várias épocas, pautada pela realidade contemporânea, vivenciada junto ao seu povo, à sua nação.

Rastreando estes personagens em vários registros históricos existentes, percebe-se que figuram como ícones indeléveis, admirados e reverenciados por uns e rejeitados por outros, em função de sua própria representatividade e princípios defendidos. Foi assim com líderes políticos, líderes espirituais ou religiosos, pensadores, escritores e filósofos, e também com artistas e cientistas, no meio de tantos, que para serem enumerados e descritos, se gastariam páginas e mais páginas.

Não obstante a defesa da tese de que a História não se repete, é quase consenso a ideia de que o comportamento social da humanidade se mantém praticamente o mesmo, com a preservação de princípios e valores recebidos como legados de suas gerações anteriores, e que proporcionaram às nações do século XXI suas atuais ideologias políticas, filosóficas e religiosas, pois, uma prática comum da humanidade, em todas as épocas, é o desenvolvimento cultural da nação.

A História mostra diferentes modelos de Educação, porém, o cuidado para com esta formação sempre ocorreu e continua a ocorrer, por isso, ao se falar de Educação de uma nação, fala-se de um dos pilares responsáveis pela sua existência e preservação da própria identidade. No entanto, nações mais jovens, especialmente algumas das que se estabeleceram nos últimos dois séculos, como a brasileira, considerando-se seu início com a independência, em relação a Portugal, em 1822, ainda não conseguiram fixar uma identidade distinguível, sobretudo, em termos educacionais. Destaca-se que o Brasil passou a ter uma Lei de Diretrizes e Bases para sua Educação, apenas no final de 1961, quando 40% da população ainda era totalmente analfabeta. Seu primeiro Plano Nacional de Educação, como política de estado, só ocorreu no início do século XXI, por isso, não é de se estranhar que a desigualdade na formação de sua população, embora tenha apresentado alguma melhora nestas últimas duas décadas, continua a ser significativa mesmo hoje.

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Nesse contexto, referindo-se ao Brasil, mencionam-se alguns abnegados, que resolveram atacar de frente o problema da Educação Nacional, especialmente o do analfabetismo em geral e da falta de escolas e métodos de ensino atualizados, para adultos e crianças de suas épocas. Fala-se neste momento, particularmente, dos denominados “Pioneiros da Educação Nova”, no início dos anos 1930, como Anísio Teixeira, Cecília Meireles, Fernando Azevedo e Lourenço Filho, dentre outros, seguidos nos anos 1950 e 1960, por Paulo Freire e Darcy Ribeiro.

No dia 19 de setembro de 1921, nasceu um dos ícones da Educação Brasileira, destacado entre os abnegados citados anteriormente, que, a exemplo de tantos outros no mundo, foi admirado e seguido por muitos e também rejeitado por outros. Fala-se de Paulo Freire, o patrono da educação nacional.

Independentemente do centenário de seu nascimento, que serve de motivação para esta reflexão, ignorar a importância de Paulo Freire na Educação Brasileira é no mínimo desconhecer a própria história. Não é raro ouvir pessoas que dizem abominar Paulo Freire, sem ter lido ao menos um de seus livros. Certas pessoas, por puro desconhecimento do tema, confundem inclusive a obra de Paulo Freire com o Método Paulo Freire de alfabetização, desenvolvido especialmente para adultos, mas também utilizado para crianças. O pensamento de Paulo Freire não se restringe ao seu método de alfabetização, sua obra toda integra o rol de temas discutidos sobretudo no âmbito da Filosofia da Educação e da Sociologia da Educação.

Em qualquer ciência, seus especialistas manifestam apreço por determinadas linhas de trabalho e métodos, e também rejeição por outros, porém, o cientista consciente, a despeito da eventual rejeição de determinado método ou linha de trabalho, não o ignora; ao contrário, passa a estudá-lo ainda mais, para saber se efetivamente seu parecer é realmente válido ou não.

Nas Ciências da Educação não é diferente. Pedagogia, Andragogia ou Gerontogogia são hoje ramos destas ciências, que envolvem a Educação do ser humano desde o início de sua existência, até seu último instante de vida e, nesse universo, devem ser considerados, no processo ensino-aprendizagem, todos os métodos e estratégias conhecidos, mais utilizados ou menos utilizados, pois são sempre importantes para o estudo do desenvolvimento da pessoa humana.

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Em nenhum momento deseja-se que somente o método Paulo Freire seja válido, para todas as realidades sociais, mas, negligenciar seus valores, dentro de sua própria casa, sua nação, quando a maioria no mundo da educação internacional não só o respeita, mas o ovaciona, é muito triste. Querer associar a obra de Paulo Freire aos parcos resultados que a Educação Brasileira ainda apresenta no cenário global é atestar desconhecimento da realidade educacional nestes últimos dois séculos, no tocante às políticas públicas apresentadas pelas sucessivas gestões dos órgãos responsáveis por ela.

Não deve existir nenhuma manifestação de adoração ou de idolatria a Paulo Freire, pois não existe a perfeição aqui na Terra, e Paulo Freire não era perfeito, mas espera-se respeito e admiração por um dos ícones da Educação do século XX, que, aceito ou não, deixou um inegável e indelével legado para suas gerações posteriores.

*Por Ítalo Francisco Curcio – doutor e pós-doutor em Educação, além de pesquisador no curso de Pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

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