A auxiliar de cozinha Nilceia Alves, 43, teve menos de 30 minutos para velar o corpo de seu filho, Guilherme Oliveira, 18, no Cemitério Cristo Rei, em Bauru (SP) na última sexta-feira (18). Pouco tempo após o início do velório, agentes da Polícia Militar invadiram o local e agrediram Nilceia e seu filho mais velho, Fabio Nascimento, 27. Vídeos gravados por parentes mostram as agressões ao lado do caixão.
Intervenção violenta da PM em velório
Depois das agressões, a família foi forçada a deixar o velório. Fabio foi levado pelos policiais em uma viatura. Nilceia relatou ao UOL que, ao ver o filho sendo levado, tentou impedir a ação, mas também foi agredida. “Socaram a cara dele, eu me agarrei com ele, aí um outro policial me jogou contra uma pilastra e eu caí no chão. Eles foram agredindo com cassetete outras pessoas estavam no local“, disse. “Eu só pedia que eles tivessem misericórdia naquele momento porque eu estava enterrando o meu outro filho“, acrescentou.
Em um vídeo gravado durante o velório, ao menos cinco policiais militares aparecem tentando conter Fabio, que estava ao lado da mãe. Segundo Nilceia, a confusão começou quando uma viatura da PM estacionou em frente ao cemitério. “Um policial começou a dar risada, falando que o sistema tinha vencido“, disse. O comentário gerou revolta entre os presentes, resultando em uma discussão que culminou com a invasão da polícia no local.
Após o tumulto, Nilceia foi em busca de Fabio, percorrendo a Unidade de Pronto Atendimento e a delegacia sem sucesso. Ela o encontrou no pronto-socorro do Hospital Central, onde ele foi atendido devido às agressões que sofreu. Após o atendimento, Fabio foi levado para a delegacia e permaneceu preso. Nilceia ainda tentou convencer os policiais a liberarem seu filho para que ele pudesse se despedir do irmão, mas teve seu pedido negado. “Eu pedi para os policiais que soltassem o meu filho para ele ter o último momento com o irmão dele. Falaram para eu ir embora porque ele não seria liberado“, contou.
A auxiliar de cozinha conseguiu retornar ao cemitério de carona com uma amiga, onde, após conversar com a administração, teve permissão para ficar mais 30 minutos velando o corpo de Guilherme. “Fui lá conversar com a moça da secretaria e falei ‘moça, pelo amor de Deus’ e ela falou ‘tudo bem, pode ficar só mais meia hora’. Aí eu voltei e fiquei velando o meu filho“, relatou.
Versão policial contestada e luta por justiça
Guilherme morreu em um confronto com a PM, segundo a versão oficial, que foi prontamente contestada pela família. Nilceia e Fabio registraram um boletim de ocorrência por abuso de autoridade e realizaram exames de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML).
“Eu só fui ter contato com o meu outro filho [Fabio] já era cerca de 19h daquela sexta. Ele foi liberado da delegacia e até hoje continua arrasado por não ter participado do velório do irmão, ele não está aceitando“, afirmou Nilceia. Fabio, devido aos ferimentos, está incapaz de trabalhar e a família tem participado de protestos em busca de justiça para Guilherme e por tudo que ocorreu durante o velório.
Nilceia também relembrou o medo e desespero que sentiu durante a invasão da polícia: “Ele [o policial] falou ‘você duvida que eu entro aí dentro e pego você?’ E a gente não acreditou que ele iria fazer aquilo. Quando a gente se deparou, eles já estavam todos lá dentro“, relatou. “Eu só abracei o meu filho, porque como eu havia perdido o meu filho por causa da polícia, eu me amedrontei. Eu falei, ‘eu não vou deixar tirar o meu filho daqui’. E eles xingavam e batiam, puxaram o meu cabelo, até que uma hora, um outro policial veio por trás de mim e me enforcou. Nessa hora, eu fiquei sem ar, aí eu soltei o meu filho e eles conseguiram levá-lo preso. Foram horas de sofrimento.”
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