*Por Cris Kerr

Transformação cultural é chave para a construção de ambientes de trabalho livres de assédio

O problema é grave porque muitas vezes o assédio é naturalizado e aceito pelas lideranças, que o veem como algo natural

O assédio, em suas diversas formas de manifestação, ainda é uma realidade em muitas empresas no Brasil. O tema é tão importante que mais uma vez analisei a fundo os tipos de assédio, para um novo livro com dados relevantes e com diversos exemplos colhidos nestes 16 anos como consultora.
Um ambiente mais amigável contribui para uma melhor produtividade – Créditos: Canva

O assédio, em suas diversas formas de manifestação, ainda é uma realidade em muitas empresas no Brasil. O tema é tão importante que mais uma vez analisei a fundo os tipos de assédio, para um novo livro com dados relevantes e com diversos exemplos colhidos nestes 16 anos como consultora.

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O problema é grave porque muitas vezes o assédio é naturalizado e aceito pelas lideranças, que o veem como algo natural, que faz parte da pressão do mundo corporativo. O exemplo vem de cima e se a alta liderança normalizar este tipo de atitude, ou pior, praticar, a transformação nunca vai acontecer.

A cultura corporativa é muito forte. As pessoas que acabaram de chegar às empresas vão aos poucos assumindo e incorporando as práticas do local de trabalho. Se o ambiente é aberto, acolhedor, a pessoa automaticamente vai internalizando e replicando as atitudes aprendidas. No entanto, se as práticas discriminatórias e abusivas são a norma, elas passam a reproduzir esses comportamentos, sobretudo ao assumir posições de liderança. Tudo começa pelo exemplo.

Felizmente, o tema tem sido focado com maior frequência, mas ainda há um longo caminho pela frente. De acordo com dados do “Estudo 2023 – Canal de Denúncias” da IAUDIT Tecnologias, companhia especializada em auditoria, canais de denúncias e compliance, o assédio moral foi reportado por 41,64% das pessoas entrevistadas. Foram analisadas mais de cinco mil denúncias, que incluem desde agressões físicas, insultos e até questões de RH e segurança no trabalho.

Para começar o diálogo sobre o tema, é preciso definir o que é assédio moral e assédio sexual. Gritos, xingamentos, comentários preconceituosos, bullying, críticas em público não deveriam ser parte do ambiente corporativo. Esse tipo de comportamento se enquadra em assédio moral. Ele pode ser definido como condutas repetitivas e abusivas em que a vítima é submetida a situações humilhantes e constrangedoras. A pessoa que é alvo destes abusos sofre com a quebra da sua dignidade, o que traz prejuízos para sua saúde física e mental.

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O assédio sexual é uma abordagem como intenção sexual de maneira não consensual por parte da pessoa assediada. Esta forma de assédio também não é rara. O Ministério Público do Trabalho (MPT) recebeu 831 denúncias de assédio sexual no período de janeiro a julho de 2023. Isso representa um crescimento de 211% em relação a 2022.

A vítima pode ser levada a acreditar que será promovida, caso aceite sair com sua liderança ou um par por exemplo. Toques e uso de violência são formas mais graves de assédio sexual e que também acontecem, infelizmente.

Vale observar que um ambiente abusivo traz impactos para a saúde e a produtividade de quem trabalha na empresa, sendo o principal fator para a Síndrome de Burnout, doença ligada ao estresse crônico no trabalho e caracterizada pela exaustão emocional, falta de motivação, isolamento, exclusão e assédio, entre uma série de outros sintomas.

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A rotatividade nestas empresas tende a ser alta e o desempenho das pessoas é pior. Isso impacta diretamente nos resultados financeiros da companhia. Este é apenas mais um bom motivo para tomar providências para combater todos os tipos de assédio dentro das empresas.

Mas o que você e sua empresa podem fazer para transformar este cenário?

1 – O primeiro passo é a informação. Todas as pessoas que fazem parte da empresa precisam entender o que é assédio e todas as diferentes formas que ele pode assumir. É preciso deixar explícito que tais atitudes trazem consequências e que a empresa não compactua com esse tipo de comportamento.

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2 – É essencial que as empresas realizem mudanças em sua cultura corporativa, se houver questões que favoreçam esse tipo de conduta. Conversas francas sobre linguagem e comportamentos que podem ser ofensivos são essenciais. É preciso gerar uma reflexão, e aqui cabe bem uma pergunta: “como eu me sentiria se me tratassem assim? Essa piada seria ofensiva para alguém da minha família? Como minha filha se sentiria se ouvisse isso?”.

3 – Além disso, a liderança tem que ser exemplo e porta-voz da transformação. O comprometimento precisa vir de cima para baixo, seguindo o código de conduta e os valores como respeito e não discriminação.

4 – Vale a pena convidar algumas pessoas para serem agentes da transformação da empresa, encabeçando a transformação cultural. É importante lembrar que todas as pessoas precisam ser incluídas no processo. O respeito não depende de hierarquia, ele precisa valer para TODAS as pessoas.

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5 – A transformação só acontece com conscientização e reflexão. A partir disso, a mentalidade de cada uma das pessoas que fazem parte da empresa muda. É preciso entender que além de não praticar ou falar frases preconceituosas, é fundamental alertar e dialogar com quem comete tais atos. É desafiador mudar comportamentos que foram internalizados ao longo de anos. Por isso, a empresa deve fazer conversas sobre esses temas.

6 – Incluir os homens na mudança é outra etapa fundamental para que haja uma transformação real. O combate ao assédio, às diferentes formas de preconceito dentro das empresas depende do envolvimento conjunto. Não é um assunto apenas para grupos minorizados, mulheres, pessoas negras, LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência entre outras. Pesquisa realizada pelo Boston Consulting Group apontou que os programas de diversidade e inclusão têm 96% de sucesso quando homens estão ativamente envolvidos. Já nas empresas em que eles não estão envolvidos, o progresso é de apenas 30%.

Diante dos desafios apresentados pelo assédio nas empresas brasileiras, fica evidente a necessidade urgente de ações concretas e comprometidas para promover ambientes de trabalho seguros e respeitosos para todas as pessoas. É imperativo que as empresas reconheçam a gravidade do problema e assumam a responsabilidade de implementar mudanças eficazes em sua cultura organizacional.

Somente através do engajamento de toda a equipe, do comprometimento da liderança e da promoção de uma cultura de respeito e inclusão é que poderemos verdadeiramente transformar essa realidade e construir um futuro onde o assédio não tenha espaço.

Vamos juntos fazer a diferença, criando ambientes de trabalho que valorizem a dignidade e o bem-estar de cada pessoa?

*Cris Kerr é CEO da CKZ Diversidade, consultoria especializada com 16 anos de atuação em DIEP – Diversidade, Inclusão, Equidade e Pertencimento, escritora do best seller “Viés Inconsciente” e “Cultura Organizacional Livre de Assédio”, professora da Fundação Dom Cabral, mestra em Sustentabilidade pela FGV.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Perfil Brasil

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