Opinião

O movimento curioso do governo israelense em admitir que tem armas nucleares

*Por Marcelo Raimon – Jornalista. Trabalhou como correspondente da agência ANSA em Buenos Aires e Washington. Ele é especialista em questões da realidade israelense.

O movimento curioso do governo israelense em admitir que tem armas nucleares
Yair Lapid (Crédito: Amir Levy/ Getty Images)

O primeiro-ministro de Israel, Yair Lapid, admitiu que seu país tem armas nucleares? Ao contrário de outros pequenos países com um arsenal atômico (Coreia do Norte, por exemplo), Israel historicamente prefere manter seu poder quieto, para que seus inimigos, o Irã em particular, não apenas o temam, mas também temam em meio à incerteza.

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Por isso foi surpreendente que, no primeiro dia de agosto, durante a cerimônia de troca da guarda na sede da Comissão de Energia Atômica de Israel (o Brigadeiro aposentado Moshe Edri sucede seu colega de mesma patente Zeev Snir), Lapid fez uma indireta, mas com uma clara alusão às capacidades do governo de Jerusalém.

“O cenário operacional na cúpula invisível acima de nós”, disse o primeiro-ministro, “é baseado em capacidades defensivas e capacidades ofensivas, e o que a mídia estrangeira tende a chamar de ‘outras capacidades’.”

“Essas ‘outras capacidades’ nos mantêm vivos e nos manterão vivos enquanto nós e nossos filhos estivermos aqui”, em Israel, acrescentou Lapid.

Seu antecessor, Naftali Bennett, também participou do evento e foi um pouco mais claro sobre a situação e o destinatário da mensagem.

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“Há um ano, tomamos uma série de decisões destinadas a melhorar nossa preparação para lidar com a questão nuclear iraniana”, disse Bennett, falando de quando ainda era primeiro-ministro. Na época, ele continuou, “alocamos enormes recursos para fechar as lacunas que nos mantinham acordados à noite”.

Não é exagero dizer que, efetivamente, o programa atômico de Teerã não permite que os principais responsáveis ​​pela segurança israelense durmam.

Raridade

A novidade foram as declarações de Lapid e Bennett, que deixaram pouco para a imaginação. Como a CNN resumiu, a mensagem “rara” do primeiro-ministro aludia ao “amplamente suspeito” arsenal nuclear israelense.

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Por que apenas “suspeito”? Porque é política oficial de Jerusalém “não confirmar nem negar” as notícias ou comentários sobre suas bombas atômicas, da mesma forma que faz, por exemplo, sobre os assassinatos seletivos que levam a assinatura anônima do Mossado ou as incursões dos aviões da Força Aérea Israelense em alvos iranianos ou do Hezbollah na Síria.

Segundo o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (conhecido como SIPRI, na sigla em inglês), Israel possui oitenta bombas nucleares, das quais aproximadamente trinta são de “gravidade”, ou seja, para serem lançadas de um avião.

As cinquenta armas restantes são ogivas a serem lançadas por mísseis balísticos de médio alcance Jericho II, que “acredita-se que estejam baseados com seus lançadores móveis em cavernas em uma base militar a leste de Jerusalém”, diz o SIPRI.

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Um relatório mais atualizado, publicado em janeiro deste ano por especialistas do Projeto de Informação Nuclear e da Federação de Cientistas Americanos, coloca o número de armas nucleares nas mãos do estabelecimento de defesa israelense em noventa.

O relatório, elaborado por Hans Kristensen e Matt Korda, também arrisca, com base em imagens de satélite, que essas “cavernas atômicas” de que fala a investigação do SIPRI tenham 23 e estejam localizadas a 27 quilômetros da capital israelense, nas montanhas da Judéia. Haveria pelo menos cinquenta mísseis Jericho na região.

Figuras conservadoras

De qualquer forma, tanto os números do SIPRI quanto os do trabalho de Kristensen e Korda parecem muito conservadores, especialmente considerando um e-mail enviado em 2015 pelo ex-secretário de Estado americano Colin Powell.

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No e-mail, obtido pelo grupo hacker russo Fancy Bear e divulgado pelo site DCLeaks, Powell comentou com um amigo sobre o discurso que o então primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, acabara de dirigir ao Congresso dos Estados Unidos para alertar sobre a perigos do programa nuclear iraniano.

Powell expressou suas dúvidas sobre as verdadeiras intenções do Irã de usar uma bomba nuclear contra seu inimigo, porque “os meninos de Teerã sabem que Israel tem 200, todos dirigidos contra Teerã, e nós temos milhares”, disse o general norte-americano.

Além disso, embora o número seja contestado, não escapa aos aiatolás que o sistema nuclear israelense -que começou “modestamente” com cientistas judeus europeus em busca de urânio no deserto de Negev em 1949 por ordem do herói David Ben-Gurion- cumpre com vários requisitos padrão de eficácia e dissuasão.

É que, junto com o Jericó armazenado nas cavernas fantasmagóricas da Judéia, os israelenses cuidaram de desenvolver a famosa capacidade de “segundo ataque”, com mísseis nucleares a bordo dos submarinos da classe Dolphin que garantem capacidade de retaliação mesmo que as bases terrestres sejam atacadas.

Em outras palavras, os líderes do regime clerical iraniano poderiam tentar realizar seu sonho de “varrer Israel do mapa”, mas os mísseis nucleares nos submarinos, por sua vez, garantiriam que poucas pessoas ficassem em Teerã para comemorar.

O governo israelense mandou construir os Dolphins em estaleiros na Alemanha, país que, por culpa acumulada pelo Holocausto, é um aliado de ferro de Jerusalém, especialmente em questões militares.

Reza a lenda que os engenheiros alemães ficaram surpresos quando seus colegas israelenses pediram tubos mais largos para lançar mísseis de submarinos. Obviamente, a razão era (e é) que esses tubos supostamente servem para disparar outros tipos de projéteis, capazes de carregar ogivas nucleares.

“Precisamos deles mais largos para que os mergulhadores possam usá-los” para entrar na água, disseram os israelenses. Os alemães fingiram acreditar neles, e os submarinos super silenciosos têm – supõe-se, porque essas coisas não são confirmadas nem negadas – com tubos mais largos para “mergulhadores”.

Um laser israelense de US $ 2 por tiro que derruba mísseis

“Parece que colocaram um Raio de Ferro em Kisufim”, um kibutz na fronteira com Gaza, um argentino que vive na fronteira com o território palestino há décadas conta para a Perfil Argentina e comentou sobre a nova chuva de foguetes que caiu em sua área. Se assim for, seria uma novidade: o sistema laser israelense, desenvolvido para interceptar projéteis lançados contra o território do país, é capaz de abater foguetes inimigos por apenas 2 dólares por disparo, conforme anunciado em junho passado pelo ainda primeiro-ministro Naftali Bennett.

Visitando uma base no norte do país para ver mais de perto como funciona o “Raio de Ferro”, Bennet disse que o dispositivo é um “divisor de águas” na defesa aérea.

“Até agora nos custava muito dinheiro interceptar cada foguete”, disse Bennett, referindo-se aos projéteis usados ​​pelas baterias “Cúpula de Ferro”, que custam em média US$ 50.000 cada.

“Este é um divisor de águas, não apenas porque estamos atacando o inimigo, mas também porque vamos levá-lo à falência”, acrescentou Bennett em junho. Algumas semanas depois, poderia ter chegado a chance de acertar as contas com o “Raio de Ferro”.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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