Opinião

Tailândia: entre ventos fortes e dominantes

*Por Patricio Carmody – Especialista em relações internacionais. Autor do livro “Buscando o consenso no fim do mundo. Rumo a uma política externa argentina consensual (2015-2027)”.

Tailândia entre ventos fortes e dominantes
(Crédito: Lauren DeCicca/Getty Images)

Os principais objetivos da política externa do Reino da Tailândia, bem como os de seus predecessores – o Reino do Sião e o Reino de Ayuttaya – têm sido a manutenção de sua independência e integridade territorial. Este tem sido um grande desafio estar localizado no coração da Indochina, cercado por inimigos e depois ameaçado por potências mundiais e regionais.

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O que viria a ser o reino do Sião foi historicamente cercado por malaios-birmaneses, Kmehrs e vietnamitas, com os quais teve sérios conflitos. Estes diminuíram no final do século 18, quando os reis Taksin e Rama I dominaram os birmaneses e grandes partes do Laos e do Camboja. Antes disso, os birmaneses destruíram totalmente a capital Ayuttaya em 1767, forçando a criação da nova capital em Bangkok. Ayuttaya já possuía uma diplomacia sofisticada e experiente, mantendo relações com diversas potências ocidentais.

Durante o século XIX, surgiram as potências mundiais, diante das quais o Sião aplicaria uma de suas duas estratégias de política externa: a de fazê-las equilibrar ou jogar uma potência contra a outra, com a qual conseguiu manter-se como o único país do Sudeste Asiático, e um dos poucos na Ásia, não colonizado por potências europeias. Assim, a Grã-Bretanha e a França tentaram disputar o território Tai e, embora o Sião tenha conseguido equilibrar uma potência contra a outra, teve que ceder territórios a ambas as potências entre 1893 e 1909. Essa entrega de quase um terço do Sião, mais o acordo para o Sião atuar como um estado tampão entre as duas potências garantiu sua independência.

Após a Segunda Guerra Mundial, a Tailândia implementou sua segunda estratégia de política externa: a do “bambu que se curva ao vento predominante”. A mudança de nome de Sião para Tailândia – terra dos tailandeses – foi promovida pelo general nacionalista Phibun em 1939. Foi Phibun quem teve que lutar contra o Japão em 1941, que queria o território tailandês como base contra as colônias britânicas na Malásia e Birmânia. Depois de resistir militarmente, Phibun optou por chegar a um armistício com o Japão, permitindo que o Japão usasse o território como base e tornando a Tailândia aliada do Japão.

Durante a Guerra Fria, a Tailândia tornou-se aliada dos EUA e membro da Seato (Organização do Tratado do Sudeste Asiático) em 1954. Embora essa aliança militar tenha sido dissolvida em 1977, as garantias de segurança dos EUA à Tailândia permanecem em vigor. A relação com os EUA se consolidou a partir de sua posição estratégica, servindo como base aérea durante a Guerra do Vietnã. Além disso, por meio do tratado Rusk-Thanat de 1962, os EUA concordaram em defender a Tailândia e financiar seus gastos militares. Economicamente, os EUA são o maior mercado de exportação da Tailândia e o terceiro maior investidor no reino.

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Dado o crescente confronto entre os EUA e a China, o antigo relacionamento com a China assume uma importância renovada. No entanto, as relações diplomáticas com a República Popular da China só foram normalizadas em 1975. Pouco tempo depois –a partir de 1978– China e Tailândia se tornariam aliadas de fato para enfrentar o Vietnã, depois que este invadiu o Camboja e ameaçou a estabilidade da Indochina. Essa estreita relação terminou com os acordos de Paris de 1991, que encerraram a crise cambojana. Atualmente, embora a Tailândia compre a maior parte de seu material bélico dos EUA, também comprou ocasionalmente equipamentos militares chineses, como 49 tanques VT-4 e três submarinos movidos a diesel. Além de ter instalado uma fábrica para a produção e manutenção dos sistemas de armas chinesas do Royal Thai Army. Isso se deve em parte a algum distanciamento entre os governos tailandês e norte-americano, após o golpe militar liderado pelo atual primeiro-ministro Prayut Chan-o-cha em 2014. Nos últimos anos, os EUA aproximaram novamente a Tailândia, que assim retorna ao praticando um equilíbrio entre grandes potências.

Diplomaticamente, a Tailândia reconhece a política de “uma China”, embora informalmente lide com Taiwan. Em termos econômicos, a China é o segundo destino das exportações da Tailândia e sua principal fonte de importações. Várias empresas familiares sino-tailandesas são membros da “rede bambu”, uma rede informal de empresários de origem chinesa que investem tanto na China como em países com minorias chinesas na Ásia. Como exemplo, a família Sino-Tai Chearavont tem sido um dos maiores investidores na China. Por sua vez, as empresas chinesas participam na construção de um comboio rápido que ligará Banguecoque à China, através do Laos.

Regionalmente, a Tailândia mostrou que quer gerar seu próprio vento de cauda, ​​em vez de ser o bambu que se curva ao vento predominante. Assim, demonstrou grande liderança e iniciativa como membro fundador da ASEAN (Associação dos Estados do Sudeste Asiático) em 1967, o que pode ser considerado um novo esforço diplomático para garantir sua integridade territorial. De fato, o objetivo da ASEAN – pilar da atual política externa de Bangkok – é assumir o controle firme de sua geografia e evitar tanto os confrontos entre seus membros quanto a interferência de potências estrangeiras, a fim de gerar maior desenvolvimento econômico. Com o tempo, seus antigos inimigos se juntariam: Mianmar –ex-Birmânia– Vietnã, Laos e Camboja.

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A intensidade do envolvimento internacional da Tailândia varia ao longo do tempo. Assim, hoje, a nível global, Bangkok parece não ver a China e a Rússia – que não levantaram a voz face ao já referido golpe de 2014 – como seus inimigos. E não parece interessada em se intrometer em disputas entre grandes potências. A Tailândia condenou o ataque russo à Ucrânia na ONU em março. Mais tarde, porém, ele decidiu permanecer neutro no conflito, absteve-se de votar para suspender a Rússia do Conselho de Direitos Humanos e se recusou a condenar a anexação russa das províncias ocupadas na Ucrânia. Ao mesmo tempo, em nível regional, não condenou a junta militar que tomou o poder em Mianmar, um dos maiores desafios enfrentados pela Asean.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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