LUTA POR DIREITOS

“Trabalho de Bruno Pereira mostra importância dos povos indígenas”, diz viúva

Beatriz Matos enfatizou a relevância de lembrar e valorizar o trabalho de profissionais que atuam na defesa dos territórios indígenas e do meio ambiente

"Trabalho de Bruno Pereira mostra importância dos povos indígenas", diz viúva
Beatriz Matos, viúva do indigenista Bruno Pereira – Créditos: Antônio Cruz/Agência Brasil

Beatriz Matos, viúva do indigenista Bruno Pereira, assassinado há dois anos junto com o jornalista britânico Dom Phillips no Vale do Javari, enfatizou a relevância dos povos indígenas, especialmente os isolados e de recente contato, para a proteção da floresta e da biodiversidade brasileira.

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Em entrevista à TV Brasil, a viúva defendeu a importância de a sociedade brasileira conhecer melhor o trabalho dos indigenistas. Beatriz é diretora de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato do Ministério dos Povos Indígenas (MPI).

Relembre o caso

Dom Phillips planejava entrevistar lideranças indígenas e ribeirinhos para um livro intitulado “Como Salvar a Amazônia” e se reuniu com Bruno em Atalaia do Norte (AM) no início de junho de 2022. Bruno, um indigenista experiente, havia se licenciado da Funai em fevereiro de 2020, discordando das novas diretrizes da política indigenista. Desde então, atuava como consultor técnico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).

A dupla foi vista pela última vez na manhã de 5 de junho de 2022. Seus corpos foram encontrados em 15 de junho, após a prisão de pelo menos cinco suspeitos. Beatriz relembra a angústia e insegurança vividas pela família durante os dez dias de desaparecimento e a falta de apoio das autoridades na busca pelos dois.

A morte de Bruno e Dom tornou-se um símbolo da luta pelos direitos indígenas e pela preservação ambiental. Beatriz destacou que a virada do governo em 2023 trouxe esperança renovada tanto para a proteção dos povos da região quanto para a reparação às famílias das vítimas.

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No início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, Beatriz foi convidada a trabalhar no MPI, na mesma área em que seu marido atuava. Ela descreveu esse período como difícil, mas também de reconstrução familiar e profissional, e uma oportunidade de reverter o sucateamento da Funai e resgatar o trabalho de Bruno.

Importância dos povos indígenas

Beatriz enfatizou a necessidade de desfazer a falsa concepção de que os povos isolados nunca tiveram contato com não indígenas. Ela destacou que, embora esses povos tenham tido contato no passado, optaram por se distanciar devido a experiências traumáticas e violência, além de problemas de saúde decorrentes desse contato.

Nos anos 1980, o Estado brasileiro começou a respeitar essa decisão e a adotar medidas para proteger os territórios desses povos, após a imposição de contatos forçados durante a ditadura militar nos anos 1970, resultando em mortes e perda de território.

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Beatriz explicou que o processo de contato é marcado por traumas, violência e questões imunológicas, resultando em consequências devastadoras para os povos indígenas. Com a política de não contato, o Estado passou a proteger os territórios tradicionais desses povos por meio de estudos da Funai para delimitar essas áreas.

Todo esse processo de realizar esse contato é marcado por traumas e violências, e também pela questão imunológica, a mesma questão das doenças. Então, muitos povos, por exemplo, na década de 70, com a expansão da ocupação da Amazônia, por frentes do Sul e do Sudeste do país, morreram nesses atos de contato, e em alguns povos sobraram pouquíssimos indivíduos. Ao longo da história, foi se vendo o quanto era violento esse contato forçado, o quanto era violento forçar esses povos a reduzir a sua mobilidade, a sua forma de vida, a um lugar específico para uma ocupação não indígena”, disse.

Ela destacou a importância dessa política para a preservação das formas de vida dos povos isolados, respeitando seu direito à recusa ao contato. A viúva também mencionou a necessidade de conscientizar a sociedade sobre a complexidade desse assunto, enfatizando que o isolamento desses povos não significa falta de conhecimento sobre o mundo exterior.

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Beatriz ressaltou a necessidade de proteger os territórios desses povos, destacando a importância dos povos indígenas para a conservação da biodiversidade e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Ela destacou a pressão contínua para explorar a Amazônia e a importância de fortalecer as políticas ambientais e indigenistas para enfrentar esses desafios.

Segundo ela, o cenário melhorou, mas os desafios são permanentes: “Não é como antes. No governo passado não havia compromisso nenhum, inclusive o ministro do Meio Ambiente falava que ia ficar passando a boiada. Nós não temos essa situação hoje. Nós temos uma situação completamente diferente, mas ainda temos esse resquício, nós temos pressão de todos lados. Então fortalecer a política ambiental, a política indigenista, é uma briga constante e diária até hoje, sempre vai ser. Ninguém pode dormir nessa causa, nesse trabalho, na verdade é um trabalho contínuo”.

Por fim, a viúva enfatizou a importância de lembrar e valorizar o trabalho de profissionais como Bruno e Dom Phillips, bem como dos servidores públicos que atuam na defesa dos territórios indígenas e do meio ambiente.

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Por isso que é importante para a gente rememorar, valorizar o trabalho do Bruno, do Dom, dos jornalistas que divulgam essa causa, que divulgam essa questão. E, dos funcionários do Ibama [Instituto do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis], da Funai, quem está na linha de frente, defendendo, de fato, territórios indígenas, as lideranças indígenas, os povos indígenas, sobretudo suas lideranças representadas aí pelo Ministério [dos Povos Indígenas]. Por isso, para a gente é muito importante também fazer esse trabalho de memória, de divulgação, para que as pessoas conheçam [a realidade dos povos indígenas]”, disse.

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