No Dia Mundial de Conscientização sobre a Violência contra Idosos, que ocorre neste sábado (15), não há motivos para celebração. Os incidentes de agressão estão em ascensão, evidenciando um longo caminho a ser percorrido no combate a esse tipo de delito. Em comparação ao ano anterior, 2023 viu um aumento de 50 mil denúncias de violência. De 2020 a 2023, houve 408.395 mil notificações, sendo 21,6% em 2020, 19,8% em 2021, 23,5% em 2022 e 35,1% em 2023.
Esses números, oriundos da análise de dados disponíveis no Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, integram a pesquisa “Denúncias de Violência ao Idoso no Período de 2020 a 2023 na Perspectiva Bioética”. A investigação culminou na publicação de um artigo.
O artigo foi elaborado em colaboração pelas professoras Alessandra Camacho, da Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Programa Acadêmico em Ciências do Cuidado em Saúde da UFF, e Célia Caldas, da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Segundo a professora Alessandra Camacho, a redução do medo da população em denunciar pode ser uma razão para o crescimento no número de casos. No Rio de Janeiro, a Ouvidoria do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) contabilizou, de janeiro de 2020 a junho de 2024, um total de 13.927 vítimas de agressões contra idosos.
Agressão a idosos: mulheres são maioria
Os principais tipos de violência identificados incluem: negligência (4.895 casos), violência psicológica (2.855 casos) e abuso financeiro (2.385 casos). Aproximadamente 70% das 13.927 vítimas são mulheres. Esses dados constam em um painel recentemente desenvolvido pelo MPRJ para monitorar a violência contra idosos no estado do Rio de Janeiro.
A coordenadora do CAO Idoso/MPRJ, promotora Elisa Macedo, esclareceu que a negligência se caracteriza pela ausência de cuidados, alimentação, assistência médica, higiene, limpeza e medicamentos. Em relação ao maior número de mulheres entre as vítimas, a promotora destacou o fenômeno denominado “feminização do envelhecimento”, que se refere à maior expectativa de vida deste segmento da população.
“O gênero, no pensar das políticas públicas para a velhice, não é levado em consideração, e a gente tem mais vítimas do sexo feminino porque temos mais idosas do que idosos. Quando faz o corte para o superidoso, pessoas de 80 ou 85 anos, essa diferença é ainda maior. As mulheres estão vivendo mais”, explicou a promotora.
Procedimentos
Após serem recebidas pela Ouvidoria através do telefone 127, pelo preenchimento de um formulário online, ou pessoalmente no subsolo do edifício do MPRJ, localizado na Avenida Marechal Câmara, 370, centro do Rio, as denúncias são direcionadas ao Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Pessoa Idosa do Ministério Público do Rio de Janeiro (CAO Idoso/MPRJ).
Os casos são examinados e, caso estejam sob a competência do MP, são encaminhados à promotoria de Justiça específica, que determina e implementa as ações apropriadas. Isso pode incluir a abertura de um procedimento, a solicitação de medidas de proteção ou o arquivamento imediato da denúncia.
“Quando centraliza tudo através da Ouvidoria, a gente consegue fazer o levantamento estatístico, depois dá o tratamento às denúncias, para saber o perfil da vítima e do agressor, o que acontece em cada região, e as violências que são mais recorrentes. A gente consegue dar celeridade porque a Ouvidoria se ocupa exclusivamente disso, então ela é rápida”, afirmou, Elisa Macedo, em entrevista à Agência Brasil.
Dependendo da denúncia, a Ouvidoria direciona o caso para o Centro de Apoio Operacional (CAO) mais apropriado para resolver a questão. Se estiver relacionado a um processo criminal, mesmo que envolva uma pessoa idosa, o caso é encaminhado aos centros de apoio da justiça criminal. “Assim, pode ser direcionado ao promotor com atribuição criminal para aquela área, pois são medidas de áreas distintas”, explicou.
A promotora aconselhou que, ao registrar a denúncia, é importante fornecer todos os dados necessários para identificar o paradeiro do idoso. “A gente precisa de algum elemento que permita dar andamento e dar o atendimento. Quando a denúncia é vaga e não traz elementos, ela acaba sendo indeferida de plano, porque a gente não tem como dar. É preciso que a pessoa quando faça a denúncia, que pode ser anônima, que conste o máximo de informação para que a gente tenha como chegar a essa pessoa e possa prestar o atendimento que ela precisa”, sugeriu.
Alzheimer
Um fato que despertou o interesse da promotora foi a verificação de que há mais mulheres com Alzheimer. Esse dado surge do requisito de diagnóstico necessário para admissão no Centro Dia de Volta Redonda, uma instituição para indivíduos com essa condição de saúde. Os pacientes passam o dia na unidade, onde recebem alimentação e participam de atividades adequadas às suas idades.
Segundo ela, de cada dez diagnósticos realizados, oito são em mulheres. Elisa Macedo mencionou não conhecer a causa, mas enfatizou que é essencial analisar essa informação ao desenvolver políticas públicas focadas nas mulheres. “Temos muito a investigar nesse campo”, afirmou.
“A ideia é trabalhar essa política porque ela é muito mais barata do que uma instituição de longa permanência para idoso, que tem um custo alto porque tem que ter uma estrutura muito dispendiosa. Ele permite também que o idoso mantenha a sua identidade e a permanência em casa”, apontou.
“A gente tem que trabalhar para que a pessoa idosa consiga manter o maior tempo possível a sua autonomia e sua independência, sua capacidade de se auto gerir. Os cuidados paliativos e a institucionalização são o final mesmo, quando não tem mais jeito”, indicou.