inovação médica

Transplante de fígado pode ajudar pacientes com câncer de intestino metastático

Estudo apresentado em evento de oncologia clínica mostra que 40% dos pacientes no tratamento tiveram sobrevida global sem a doença

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Transplante de fígado pode ser solução para pacientes com câncer gastrointestinal em metástase – Créditos: Canva

Indivíduos com câncer colorretal e metástases exclusivamente hepáticas, tratados com quimioterapia, podem beneficiar-se do transplante de fígado como parte do tratamento oncológico. Essa é a conclusão de um estudo apresentado na ASCO 2024, evento anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, em Chicago, EUA. O estudo revelou que, após cinco anos, 40% dos pacientes submetidos a transplante tiveram sobrevida global sem a doença, em contraste com aqueles que não realizaram o transplante e seguiram apenas com quimioterapia.

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Metástases hepáticas são mais frequentes em pacientes com cânceres gastrointestinais, como os tumores colorretais que afetam o cólon e o reto. No Brasil, o transplante de fígado é reservado para pacientes com tumores originários do próprio fígado, como o hepatocarcinoma. O protocolo padrão para metástases inclui quimioterapia para diminuir as massas tumorais, seguida de cirurgia hepática.

O desafio é que a quimioterapia nem sempre é eficaz. Existem situações em que ela reduz o tamanho dos nódulos, mas não o bastante para permitir a cirurgia. A alternativa seria continuar a quimioterapia indefinidamente. Pensando nisso, pesquisadores da França, Itália e Bélgica decidiram explorar os benefícios do transplante de fígado.

Para tal, selecionaram 94 pacientes, de 2016 a 2021, com câncer colorretal metastático confinado ao fígado, que respondiam à quimioterapia, mas não eram elegíveis para cirurgia devido ao grande número de nódulos — cerca de 20 em média. Os participantes foram divididos aleatoriamente para receberem transplante de fígado juntamente com quimioterapia ou apenas a quimioterapia convencional.

No final do estudo, 40% dos que receberam transplante estavam completamente livres da doença, três (8%) necessitaram de retransplante e um faleceu após a cirurgia. De acordo com os pesquisadores, o transplante de fígado, quando combinado com a quimioterapia, aumentou significativamente a sobrevida dos pacientes selecionados, levando-os a defender a terapia como uma nova opção de tratamento que pode alterar a abordagem clínica desses casos específicos.

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Em entrevista à Agência Einstein, o oncologista clínico Diogo Bugano, do Hospital Israelita Albert Einstein, afirmou que os resultados são  promissores. Entretanto, acredita que o tratamento de transplante não é tão simples para os pacientes com câncer.

“O primeiro problema é que o sistema imune do paciente é extremamente importante para combater o tumor e a pessoa transplantada é imunossuprimida para não rejeitar o órgão. Por isso, existe o receio de fazer a cirurgia e, pós-transplante, descobrirmos que havia metástase em outros órgãos e o tumor voltar no fígado transplantado”, explicou. “Mas, nesse estudo, entre os transplantados, 40% ficaram sem doença por cerca de cinco anos depois, enquanto os outros pacientes ou morreram ou continuaram fazendo quimioterapia. É um resultado muito surpreendente e impactante”.

Segundo Bugano, diferentes países adotam critérios distintos para transplantes e, em alguns, existe uma maior disponibilidade de órgãos de cadáveres em comparação com o Brasil, o que torna mais fácil a implementação da terapia. No caso do Brasil, considerar o câncer de intestino como uma indicação para o transplante de fígado é uma novidade, e tal indicação requer uma avaliação criteriosa para não afetar negativamente outros pacientes na fila de espera.

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Um dos acordos dos pesquisadores com as centrais de transplante para fazer o estudo era que esses pacientes não ficassem mais de dois meses na fila de espera, porque eles estariam sem receber quimioterapia. Então foi negociado um acordo excepcional para que eles fossem considerados prioritários na fila”, disse. “Aqui no Brasil sofremos com a falta de órgãos. Como o câncer de intestino é muito comum e costuma dar metástase no fígado, se isso fosse aplicado aqui, muitos pacientes teriam que passar na frente e não teria órgão para todos”.

Para Bugano, a saída é considerar o transplante intervivos (de parente que seja parcialmente compatível) em pacientes que já estão com metástase. “Nesses casos, não tem fila de espera. Existe algum risco para o doador, mas é muito pequeno. Para quem recebe, segue o fluxo de transplante normal, pois essa porção (cerca de 30%) de fígado saudável vai melhorar a vida do paciente. Esse trabalho veio validar que o transplante de fígado é uma terapia que temos que avaliar cuidadosamente com nosso paciente se faz sentido ou não. É mais uma opção que poderá ser discutida”, diz.

Mudanças no transplante de fígado

O oncologista clínico Rafael Kaliks, que também é do Einstein e participante da ASCO, acredita que este estudo pode representar o início de alterações na prática clínica, uma vez que pacientes com câncer gastrointestinal apresentam uma probabilidade elevada de desenvolver metástases hepáticas.

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“Esse é um trabalho extraordinário que, pela primeira vez, mostra um aumento significativo de sobrevida em pacientes com câncer de intestino com metástases hepáticas. A diferença em termos de sobrevida desses pacientes é muito maior entre aqueles que foram transplantados. Pode ser que, depois disso, a prática comece a mudar”, avalia.

Fonte: Agência Einstein

 

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