Novas tecnologias

Civilização ou barbárie 2.0

*Por Joan Cwaik – Autor e promotor. Especialista em tecnologias emergentes.

Civilização ou barbárie 2.0
(Crédito: Canva Fotos)

A crise das hipotecas subprime de 2008 coincidiu com uma época de profundas mudanças tecnológicas que às vezes esquecemos. Procuremos nos situar um pouco nesse tempo distante e escuro. Havia alguns aparelhos estranhos para tocar música chamados MP3, havia também um incômodo sistema de entretenimento sob demanda que o obrigava a sair de casa, alugar um filme e pagar por ele. E claro, pagar novamente quando esquecer de devolver depois de 24 ou 48 horas… Como você levou o filme para casa? Claro, que iludido, esqueci de esclarecer: os filmes, como muitas outras coisas, vinham em DVD. Os telefones, entretanto, eram bastante rudimentares. Naquela época, o BlackBerry estava bombando, mas se você quisesse falar um pouco mais já tinha que recorrer a um sistema arcaico no computador conhecido como MSN Messenger, cuja consequência é que muitas pessoas da minha geração hoje continuam a ter caixas de entrada de e-mail do hotmail.com.

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Mas a questão é que, em 2008, quando a crise começou a gerar uma visão mais negativa do futuro, muitas das tecnologias que usamos hoje começavam a existir, ou estavam se difundindo. Em 31 de outubro de 2008, poucas horas após o colapso do Lehman Brothers que levaria a uma crise quase sem paralelo, Satoshi Nakamoto – o pseudônimo usado pela pessoa ou pessoas por trás da tecnologia bitcoin – publicou o primeiro whitepaper Bitcoin, propondo um sistema que superaria a necessidade de intermediários como bancos e instituições financeiras para facilitar e auditar as transações. Bom momento. Mas não apenas cripto.

WhatsApp, Twitter ou Facebook. Em muitos casos, essas tecnologias possibilitaram ampliar as mensagens dos protestos, e serviram de base para o surgimento de novos tipos de lideranças e ativistas, mas também se tornaram alvo de críticas e em alguns casos foram apontadas como uma das as causas dos protestos, os conflitos. Para o ensaísta indiano Pankaj Mishra, a história ocidental nos mostra que a modernidade sempre esteve associada à desordem e ao conflito. Desde a Primeira Revolução Industrial, o mundo assistiu a uma espiral de turbulências, revoluções e guerras de grande escala: A Revolução Francesa, as revoluções de 1848, a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, ou o Nazismo, entre outras. Mas para Mishra, que essas duas situações – a Primeira Revolução Industrial e a explosão de conflitos civis, bélicos e internacionais – tenham ocorrido ao mesmo tempo não é por mero acaso. Em vez disso, há um certo efeito causal entre um e outro. O autor indiano refere-se ao presente como um momento de violência selvagem que “os historiadores do futuro poderão ver como o início da terceira – a mais longa e estranha – de todas as guerras mundiais: uma guerra civil global”. Muito forte.

“os historiadores do futuro poderão ver como o início da terceira – a mais longa e estranha – de todas as guerras mundiais: uma guerra civil global”

Como podemos ver, canções, literatura, colunas de opinião, ensaios e frases como a de que todos os tempos foram melhores vêm criando um senso comum negativo sobre o presente nos últimos anos. De fato, vivemos em uma época estranha, em que podemos fazer uma vacina para uma pandemia em menos de um ano, mas mais de trezentos milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de depressão.

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Será que realmente estamos enfrentando o pior momento da humanidade? Não sou historiador, nem pretendo fazer historiografia, mas ouso afirmar que deve ter havido tempos piores. Ou que, na verdade, não somos tão ruins quanto pensamos.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

*Texto publicado originalmente no site Perfil Argentina.

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