Administração de negócios

A inconcebível generalização do paternalismo no mundo corporativo

*Por José Renato.

A inconcebível generalização do paternalismo no mundo corporativo
(Crédito: Canva Fotos)

Após anos atuando como responsável pela área de Administração de Contratos em uma grande empresa brasileira, Araújo Lima foi informado que passaria a atuar no Board de Consultores. Assim era chamado o grupo de profissionais mais experientes que, após muito tempo de casa, passava a atuar na empresa como consultores, sob regime de contratação de pessoa jurídica. Ainda que pudesse parecer apenas uma forma de reduzir custos, por conta dos altos salários, a iniciativa desta organização tinha também como objetivo permitir que estes profissionais investissem parte de seu tempo na empresa, acompanhando os novos profissionais que passaram a atuar em suas antigas posições, uma espécie de mentoria, ainda que assim não fosse chamado.

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Em seu lugar veio Pereira da Silva, profissional que gerenciara alguns projetos da empresa e que chegara com o objetivo de disseminar as práticas de administração contratual pelas outras áreas organizacionais. Um gordinho simpático de sorriso fácil, Pereira da Silva tinha uma fala mansa e sua chegada vinha chancelada por uma forte indicação do presidente da empresa, com quem trabalhara durante alguns anos. Empresa familiar, o paternalismo era algo muito presente e costumava ser um critério de seleção relevante nesta organização. A justificativa costumava estar embasada em uma questão importante, embora às vezes muito questionada, colocar pessoas da confiança em certos cargos. Coube ao tempo explicitar o equívoco que aquela decisão provocaria.

Dono de um conhecimento raso sobre boa parte dos assuntos nas quais atuava, Pereira da Silva podia ser considerado um especialista em ser generalista e demonstrava muitas dificuldades em seguir as orientações de Araújo Lima. Entre um sorriso e outro, pontuava aos mais próximos que não conseguia aprender e que, por conta disso, todo orgulhoso, comentava sobre a sua estratégia: levar duas colaboradoras da equipe de Araújo para acompanhá-lo em qualquer reunião. Confesso que passei a constatar a veracidade de tal fato que costumava ser evidenciado ao vê-lo roer unhas freneticamente, enquanto sua equipe se mostrava atenta durante as discussões. Não demorou para que sua liderança passasse a ser questionada pela equipe, em um claro sinal que o desafio que lhe fora pontuado, certamente, jamais seria alcançado.

Informado da situação, seu diretor, Reinaldo, não se fez de rogado e, diante da convicção de que precisaria substituir imediatamente o indicado de seu presidente, tomou a sua melhor decisão. Logo pela manhã do dia seguinte, chamou-o até sua sala e, de supetão, junto aos demais membros da equipe, o convidou para ser tornar diretor de uma nova área de negócio a ser desenvolvida na empresa. A surpresa foi geral, embora contida, e, enquanto roía o pouco que ainda lhe sobrava de unha, acenou com a cabeça que aceitaria este novo desafio. De imediato, foi feita, ali mesmo, em viva voz, uma ligação ao presidente da organização para lhe dar a boa nova. Foi dele que veio a frase que explicaria tudo: “… esta foi a melhor decisão que poderia ter sido tomada, Pereira da Silva é a pessoa mais indicada para este cargo neste novo negócio…”

Em tempo: este novo negócio causou um tamanho prejuízo na empresa e acabou por contribuir para a demissão de Reinaldo da organização onde atuara por décadas, sem que sequer a oportunidade de fazer parte do Board de Consultores lhe fosse dada. Neste tempo, Pereira da Silva já estava em um outro novo desafio profissional chancelado por seu padrinho de sempre.

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*Consultor em Gestão de Projetos, Pessoas e Inovação.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Perfil Brasil.

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